“Ostra Feliz não faz pérola”, já diria Rubem Alves em uma de suas metáforas poéticas, metáfora esta que enseja a idéia de que a produção é resultado direto de alguma espécie de sofrimento. O caríssimo autor coloca que sem a dor, ou a infelicidade momentânea, a ostra não dá ao mundo a beleza de sua pérola. Antes de se pretender ser bonito, esse texto é sim fruto direto do sofrimento, físico (que neste instante me acomete) e social, de ser mulher. A idéia aqui é (re)produzir por meio das palavras a indignação.
Essa indignação que grita por se expressar vem também acompanhada pelo desejo de denotar que a dor feminina (moral, psicológica ou física), estrategicamente ocultada da realidade das relações postas e naturalizada pela dinâmica capitalista de resolução imediata para as ocorrências diárias (suprimento lucrativo de demandas), é tão parte de nossas vidas quanto o sol aparecer cada manhã. No entanto, homens e mulheres, vitimizados/moldados pelo machismo, acabam por absorver, inconscientemente, os comandos sócio-culturais de abstração dessas construções históricas. As mulheres silenciam sua dor, por não entendê-la ou enxergá-la como parte do processo de imposição dos valores masculinos, e os homens, herdeiros do legado machista e/ou opressores de carteirinha, desconhecem ou permanecem indiferentes a essa dor.
E aqui faço uma breve explanação de que se trata sim, também, de um processo de vitimização, de homens (isso mesmo!) e mulheres. É preciso ressaltar que o feminismo objetiva atacar e desconstruir o machismo, e não os homens. Não se pode querer combater a desumanidade do preconceito aqui enfatizado com a mesma moeda, desconsiderando a condição humana do homem, que nada mais é que fruto de gerações e gerações de domínio masculino sobre a mulher. É claro que conhecer e, ainda assim, reiterar (ou mesmo se abster de conhecer) como tal domínio encontra respaldo em nossa sociedade é prática agressiva e atentória à nossa dignidade feminina. Mas há que se reconhecer que esta prática amplamente corroborada tem sua matriz cultural, histórica e ideológica nas raízes capitalistas. Com isso quero apenas dizer que, assim como muitas mulheres, embora incorram em condutas machistas, não vislumbram o teor violador de suas ações (por conta da sua naturalização), muitos homens oprimem sem o ânimus de fazê-lo, de forma não deliberada, por ignorarem os efeitos de suas práticas. Assim, é indispensável trazer à tona que a dor é a fiel companheira de nós mulheres e que é possível ser, se não erradicada, pelo menos diminuída, bastando para isso que sejamos enxergadas como seres humanos.
Voltando ao cerne da questão, situação que me motivou a escrever essas linhas de indignação, quero tratar da dor como fonte de lucro ou mercadoria, resultante da ressignificação das conveniências capitalistas, e de seus efeitos no cotidiano feminino. Para tanto, há que se expor a lógica de subjugação e naturalização do corpo da mulher que, na melhor das hipóteses, é força de trabalho que sustenta a economia capitalista, sem o devido reconhecimento, e fonte de deleite e prazer para o indivíduo do sexo masculino, resguardando-se assim, também, o machismo. Para ser mais específica, quero tratar da cólica menstrual por meio de uma indagação crucial: a quem/que serve esta dor pélvica de que porcentagem considerável de nós, mulheres, padece mensalmente?
Para responder essa questão, basta perceber as filas crescentes em clínicas ginecológicas particulares de mulheres desesperadas por um tratamento combativo e eficaz contra este calvário. Ressalto as clínicas particulares por que as públicas, via de acesso (?) de mulheres pobres, teriam pouca demanda deste tipo de reclamação, uma vez que esta epidemia é ainda mais naturalizada entre as camadas populares, devido à negação do acesso à informação de que há reversibilidade para este sofrimento. Sem falar no aumento significativo de campanhas publicitárias de absorventes, analgésicos e até cosméticos, porque é impossível trabalhar ou estudar- e dessa forma, ocupar as ruas, espaço natural do homem - com cara de azedume, facilmente notada pela invasão das olheiras, resultantes das noites mal dormidas, e espinhas, típicas do período menstrual. As indústrias bioquímicas e de produtos de higiene pessoal, além das redes de farmácias e lojas de conveniência, agradecem.
Toda essa análise poderia cair por terra se a cólica menstrual (dismenorréia, primária ou secundária) fosse um processo saudável do organismo feminino. Mas não é. Tive o cuidado de ler um pouco mais a respeito, antes de me indignar verbalmente, e pude constatar que a causa para este mal é eminentemente machista. Explico-me. A mulher desenvolve a dismenorréia primária pelo aumento da produção de prostaglandinas no útero, que promovem contrações uterinas dolorosas. Essas substâncias são mais ligeiramente processadas no corpo feminino como forma de resposta à ansiedade ou estresse, depressão (principalmente se associada com distúrbio alimentar), dificuldade de relacionamentos interpessoais, história familiar, (especialmente se parente de primeiro grau), menarca em idade jovem, entre outros fatores. Vale ressaltar que o aumento considerável de prostaglandinas, ocasionado pelo agravamento das situações antes mencionadas, pode causar lesões no útero, tais como a endometriose, inflamação pélvica, mioma, adenomiose, cistos ovarianos, varizes pélvicas e anormalidades congênitas uterinas e vaginais, causando assim a evolução do quadro clínico da dismenorréia primária para a secundária.
Fácil notar que todas estas situações corriqueiras - potenciais desencadeadoras das dores físicas às quais nós, mulheres, já estamos familiarizadas - estão diretamente relacionadas à posição da mulher na sociedade machista e às expectativas aí geradas. O lugar da mulher é reflexo da divisão social do trabalho, que nos estabelece territórios e responsabilidades próprias. A tripla jornada de trabalho de esposa, mãe e trabalhadora nos condiciona a existência à estrita obediência aos padrões de beleza, aos cuidados com o lar, à sensibilidade (ou fragilidade) nas relações e ao trabalho duro e desgastante, já que os nossos salários ainda são menores que os dos homens (ainda que todos desempenhemos as mesmas funções). Ansiedade, depressão, distúrbios alimentares são apenas capítulos da desumanizante e castradora novela da perfeição, ideal há muito cobrado pelos homens e, impensadamente, reivindicado por nós mulheres. A intensa circulação de livros de auto-ajuda está aí para comprovar isso.
Para complicar ainda mais o quadro da dor física desenvolvida pelas cólicas menstruais, que geralmente não se encerram em si, fazendo-se acompanhar por transtornos gastrointestinais (inclusive com vômitos), dor referida nas costas, nas coxas e cefaléia, não nos esqueçamos de que quando a dor é demasiado intransigente, o rendimento (ou sua falta) no trabalho e nas atividades diárias cai exponencialmente, gerando-nos ainda mais constrangimentos e desconfortos, financeiros e sociais. E como se toda essa porcaria machista até aqui exposta ainda não fosse suficiente, somos obrigadas a suportar piadinhas de estupro, o tolhimento de nossa forma de vestir e agir, o abafamento de nossas falas, a rotulação de nossas práticas e a restrição de cargos políticos a serem ocupados. Só pra efeitos de ilustração de como nosso sofrimento é desmerecido, não faz muito tempo vi tweets de rapazes que afirmavam: “Deu até vontade de menstruar para poder usar esse absorvente da propaganda da Paola Oliveira”. A despeito de toda a beleza livre e jovial (e obviamente idealizada, porque é impossível se sentir nessas condições com todas as pontadas hardcore que as cólicas nos dão) que a propaganda transmite, afirmar tal coisa é nem se dá ao trabalho de se colocar no nosso lugar, e mesmo fazendo-o, é achar que tamanha dor é suportável, irrelevante. Tenha dó!
A minha indignação neste momento que me proponho a concluir este texto fica ainda por conta da minha segunda noite perdida de sono e, conseqüentemente, de toda a bagunça orgânica que sobra pro resto do dia. Sei que esse drama não é exclusividade minha. Como sei também que ainda existe toda uma cultura de terror, implícita e explícita, relacionada à minha liberdade sobre meu corpo. E se por acaso eu quisesse me entupir de anticoncepcionais para aliviar minha dor, mesmo sabendo que eles podem produzir efeitos colaterais, tais como ganho de gordura, estrias, celulites e etc...? E se eu decidisse não mais menstruar, retirando de vez o útero ou os ovários? Não seria essa uma forma precoce de não mais procriar e por tanto não mais colocar no mundo futuras forças de trabalho? Ou pior, não seria lamentável perder entre todas as minhas capacidades, aquela que faz de mim essencialmente mulher: a de ser mãe?
Sem esquecer meu lugar de origem acadêmica nessa história toda, venho da graduação em um campo do conhecimento que nega absurdamente o sexo dos sujeitos de direitos, porque o próprio conceito destes sujeitos ainda tem classe, cor, idade e gênero definidos. Para mim, resta a certeza de que o Direito, fruto do Estado Liberal de alijamento de direitos, nada faria para proteger esta pobre infeliz prostrada, massacrada pela dor (e debruçada sobre o notebook e a revolta incontida) da sarjeta social que o machismo nos impõe.
Mas sim, ainda somos o sexo frágil e merecemos flores e chocolates (que são sempre preferíveis ao sexo) no nosso dia como prêmio de consolação! E no turbilhão das dores, do corpo e da alma, se fez esta pérola: raivosa, sem brilho e áspera, como as marcas que os séculos nos deixam.
Observação: texto parido inicialmente para postagem no “Blogueiras Feministas” e aqui postado para compartilhamento de críticas sobre o Machismo, no Dia Mundial do Homem.
Faltou só a legenda da última foto, Juliana.
ResponderExcluirDigo isso porque me vi com dificuldades quando provocada a lançar imagens pro poema "poética feminista".
Queria relacionar o Direito Insurgente, o Direito Achado na Rua com as mulheres que discutem com palavras, experiências e acões o machismo e o Direito e vi o quanto ainda somos poucas, tão poucas como exemplos, lideranças no Direito... Contraditoriamente... porque estamos tão presentes em todos os espaços, enfrentando na luta diária essa resignificação do Direito construído a partir das lutas na rua...
Trazer pras vistas o que está tão escamoteado, tão coberto.
Descobrir-nos, tirando a roupagem encaixotada que nos generaliza e que não mostra que todos os nossos discursos tem sim gênero. Enfim, longa discussão... Aguarde cenas dos próximos capítulos, rsrsrs.
Mas voltando a foto... Depois do desafio de encontrar uma mulher que simbolizasse a poesia, percebi que tinha uma função dupla: mostrar um símbolo do escândalo, de uma mulher que simplesmente foi o escândalo... Frida. E outra: mostrar como nós todos os dias provocamos os encândalos diários, rssrr. Democraticamente.
Dar nome à sua foto, situá-la, não só mostra o quanto a luta feminista é democrática e partilhada, sem líderes, vanguardeirices e ineditismos, mas o quanto nós mesmas, cada uma, a construímos e nos empoderamos na caminhada.
Ju,
ResponderExcluirParabéns pelo texto! Nos ambientes tão (pretensamente) ascéticos em que vivemos, temos medo, nojo, das nossas próprias dores, nossas condições e, também, das opressões que carregamos e/ou legitimamos. O fato recente daquele apresentador, que se reivindica humorista, do CQC em comentários misóginos, onde abominava qualquer vaginas ou seios que não os servissem pra sua imaginação sexual, é um exemplo claro disso.
E muito importante que essas inquietações sejam trazidas por uma mulher. Pois ainda estamos acostumados a ouvir, muitas vezes sem reflexão, o homem falar da mulher, o branco do negro, o adulto falando em nome da criança e do adolescente. E aí dialogo com o que Diana colocou. Mesmo no ambiente que se pretende crítico, de resistência e enfrentamento ao capitalismo encontramos, não raro, essas barreiras.
E lembro de uma discussão que já tivemos algumas vezes, dentro do CORAJE, sobre a RENAJU. Antes mesmo de participarmos dos espaços da Rede, e também posteriormente, sempre quando se falava nos corredores de "nomes" da rede - pessoas que se "destacavam" pelas falas ou pelo posicionamento político ou pelo acúmulo na construção da rede - quase sempre se falavam em nomes masculinos. Em uma rede tão articulada, tão levada, formulada, proposta e construída por mulheres, vimos os homens, muitas vezes, se sobressaírem. E pouco nos perguntarmos o porquê disso.
Quanto ao texto, tenho um primeiro questionamento quanto à esse trecho:
"Mas há que se reconhecer que esta prática amplamente corroborada tem sua matriz cultural, histórica e ideológica nas raízes capitalistas"
É fato que o capitalismo se apropria da dominação histórica do homem sobre a mulher, utilizando a mulher como mercadoria, em diversos momentos, como você bem colocou. Mas as raízes dessa dominação advém do capitalismo? Ou apenas o capitalismo se apropria e reforça essa opressão?
Quanta a pergunta central da tua postagem (a quem/que serve esta dor pélvica de que porcentagem considerável de nós, mulheres, padece mensalmente?) achei fundamental essa pergunta ser feita. Afinal de que outro modo saberíamos (falo enquanto homem), sobre as dores (e delícias) de ser mulher, se não forem vocês mesmo levantando sua voz? E aí impressionante como essa dor pode ser consquência e, ao mesmo tempo, objeto de mais opressões e utilizada pelas conveniências mercadológicas.
Uma amiga minha possui uma doença, que não me recordo o nome agora (sintomático isso, talvez), mas que sei tem a ver com cólicas fortes e, muitas vezes, insuportáveis. As mulheres portadoras dessa enfermidade há um tempo brigam para que sejam reconhecidas e permitidas faltas e outros direitos no ambiente de trabalho para um tratamento eficaz e uma jornada que não agrave suas doenças. Mas, como de se esperar, a luta é silenciada e encontra diversas barreiras. Afinal, não querem empregar uma mulher que teria "problemas" de saúde por conta de sua condição... de mulher! Melhor é tratar todo mundo como igual nas obrigações, e reforçar a idéia de que a masculinização da mulher é sintoma de seu sucesso "de como a mulher vem ganhando cada vez mais lugar no mercado"...
Espero, assim, ver mais contribuições femininas e feministas no blogue!
Algumas referências importantes pro debate. No momento, só divulgando. Volto a elas em outros posts.
ResponderExcluirDonna Haraway escreve sobre "Gênero" para um dicionário marxista: a política sexual de uma palavra
- http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-83332004000100009&lng=en&nrm=iso&tlng=pt e
Heleieth Saffioti defendendo a utilização do conceito de patriarcado para tratar das violências de gênero. Ela trabalha as noções de exploração e dominação e a tríade raça-genero-classe.
http://www.scielo.br/pdf/cpa/n16/n16a07.pdf
Ju,
ResponderExcluirSenti-me esbofeteado por seu texto. Pancada dura no estômago. Falta de ar é o mínimo depois deste verdadeiro pancrácio! Sim, lá vou com minhas botas masculinas-capitalistas colocando a força na frente da delicadeza, mas não há como deixar de perguntar: o que vem a ser o "feminino"? uma construção histórica ou uma essência biológica? ou seria mesmo uma eclética essência histórica?
De qualquer forma, da totalidade concreta nós não podemos escapar e o seu texto é depoimento disso. A fabricação da TPM e o uso homeopático da dor pélvica nos coloca frente a um abismo: o que fazer?
Me parece que é sempre tarde, mas nunca tão tarde para desistir: o não-lugar (aquele em que marcamos no mapa do tempo como "u-topia") é o horizonte de quem precisa ver alterada, e alterar, todas as estruturas. O capital não prescinde do patriarcado e ainda que não saiba eu quem veio antes, se o ovo ou a galinha, sei que só a exterioridade concreta mudando a totalidade das relações sociais e das forças produtivas poderá dar alguma resposta satisfatória a nossa irmanação por um mundo em qua caibam todos.
Por enquanto, fico ruminando suas acachapantes frases...
gente...
ResponderExcluirmuita fala colocada! que feliz!
o desafio é dialogar com todas elas. seria. porque no fundo, ao reler os comentários, percebo que a intenção do texto foi alcançada: é preciso expor a dor, mulheres!
aqui já até faço uma ponte com a fala do Pazello, que questiona o que vem a ser o "feminino". para mim essa é uma pergunta basilar pra começo de qualquer discussão sobre feminismo. acredito que não tenhamos grandes dificuldades em perceber que é uma determinação cultural e social já bem assimilada ao longo dos anos. se pararmos pra nos questionar a idéia de feminino que temos, na certa chegaremos a estereótipos como ser cuidadosa, emotiva, organizada, bem arrumada. não raro nos deparamos com a ideia amplamente difundida nas mídias sociais de que precisamos dar asas à mulher que há em nós, homens e mulheres, pra ter um mundo melhor. eis ai mais um prato cheio pra indústria da beleza e da moda, que quer assim apelar pra o lado compulsivo-consumidor-feminino dos homens.
puxei essa discussão porque acredito que a diferença entre homens e mulheres é basicamente fisiológica e anatômica e, portanto, é preciso que nós mulheres evidenciemos aquilo que é imperceptível para o homens. mas sabemos que dessas diferenças fisiológicas e anatômicas surgem as deturpações, e aí passamos a ter diferenças sociais e culturais..sendo também imprescindível que denunciemos as dores morais, psicológicas e sociais às quais estamos submetidas.
como Pazello colocou, e que casa com a pergunta do Lucas, também não sei bem quem surgiu primeiro: machismo ou capitalismo. e ae quero ressaltar que embora eu tenha afirmado categoricamente no texto a origem do machismo, esse foi um ponto que tive insegurança. mas deixei como estava, na esperança de que o debate fosse suscitado. e foi. perdõem-me também, mas estava com cólica quando escrevia esse texto. (=P). Tudo o que sei é que essas duas doenças mortais se alimentam reciprocamente, tornando-se indissociáveis.
Lucas me fez uma crítica em outra situação pela ausência de imagens de mulheres negras ou pobres entre as que foram postadas. isso me fez refletir o quão enraizados estão os preconceitos em nós: eu mesma não me alertei pra isso quando procurava as imagens. e ae, Diana, tens toda razão de procurar por ilutrações desprovidas de vanguardismos ou ineditismos, pois somos todas nós vítimas dessas atrocidades, brancas, negras, ricas ou pobres. (mas quando vc, Diana, me falou da legenda da imagem, não entendi. é a primeira vez que posto eu mesma aqui no blogue...e confesso que apanhei um bocadinho pra fazê-lo rsrsrsrs).
por último, é mesmo muito flagrante a ausência de vozes e publicações das mulheres renajuanas e de luta, seja em que espaço for. no Direito, a voz feminina é muito mais que necessidade: é pressuposto de um Direito construído pelo povo, em sua maioria composta de mulheres. Alimentemos, companheiras, o gosto pela fala e pelo grito, se preciso for, ainda que seja um grito de dor.
fazendo o adendo: quando coloquei ausência, queria dizer que as vozes são silenciadas, esquecidas, escamoteadas, negligenciadas, como bem me alertou Lucas. =)
ResponderExcluirSobre as legendas da última foto, Juliana, era só porque vi alguém próxima a mim mesma (diferente das outras), escrevendo a própria história.
ResponderExcluirEssa informação permite o registro na minha mente (e de quem mais ver) e o cuidado pra não perder de vista essas duas meninas com cartazes na mão. Tenho cá comigo que não podemos nos perder de vista, nenhuma de nós.
E outra: é preciso que nós falemos de nós mesmas, já que ninguém ou pouca gente fala (será que tão poucas mulheres construíram a RENAJU, por exemplo?). Que nos encorajemos a participar dos espaços. Que nos fortaleçamos.
Falando nisso, até bem pouco tempo, não tinha visto tua descrição no "quem somos". Tarefa de casa, companheira.
A nossa militância (das mulheres) pode permitir trazer em nossos bolsos e corpos e o que foi relegado ao feminino e expurgado da política, do público.
Entendo a nossa tarefa como a de misturar o que a modernidade pretensamente separou. O publico e o privado, a razão e a sensibilidade. Não somos "só" o "feminino", mas terminamos por ficar com boa parte dele guardado nos nossos próprios corpos nos espaços privados. Está na hora de difundí-lo e compartilhá-lo com os homens, favorecendo o espaço para que eles também possam manifestá-lo.
Apesar de não acreditar que temos diferenças puramente anatômicas, até porque o corpo não é um ente separado da nossa mente e da nossa sensibilidade, não me atrevo a determinar onde começa esse biológico e onde começa o que é histórico.
Até porque o que entendemos como biológico é também historicamente construído. Aqui me remeto ao capítulo sobre ciência do Boaventura em Critica da Razão Indolente e aos estudos da teoria queer (ver http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-83332006000200020&script=sci_arttext) que questiona o "não se nasce mulher, torna-se mulher" e a anatomia no que diz respeito às pessoas que não se sentem com o sexo que nasceram e o mudam, por exemplo.
Sobre as dificuldades com as legendas, Juliana, mais um traço de gênero. A gente foi educada a ter mais distãncia com a tecnologia. Os homens são bem mais incentivados a se enveredar e decobrir coisas a esse respeito (vide cursos de computação e engenharia), mas a gente tem que romper essas barreiras... Eu também visto a carapuça e estou me esforçando...
Um forte abraço e um beijo bem estalado
Diana
bonita, Diana, tua sensibilidade de, por meio de legendas, identificar e não perder de vista rostos, corpos e desejos que se juntam e se reconhecem na luta por um mundo de igualdade. prática que deve ser reiterada. =)
ResponderExcluirsobre minha tarefa de casa, já tinha sido provocada antes por Pazello a cumpri-la, mas vou confessar que me amedrontei e me encolhi diante das descrições e currículos. hahahahaha. sou só mais uma bacharela em Direito, proveniente das terras quentes, massacradas e bonitas piauienses, ainda sem muito rumo na vida, mas com toda uma inclinação pra continuar na luta pela defesa de direitos e da dignidade human@s, projeto de mestrado em mente e muita vontade de discutir as inquietações.
eu sei que tanto o blogue quanto a AJP, digo como participante de uma que fui, o projeto CORAJE-UESPI, são espaços abertos, democráticos, de discussão e construção coletiva e de fomento à crítica e, como tal, não há espaço pra quem sabe mais ou quem tem a fala melhor que outras. mas, por bobagem minha, acabei me intimidando em discorrer sobre mim.
sobre serem diferenças meramente anatômicas, já venho discordando de mim mesma. com a certeza de que somos resultados de construções e desconstruções de nós mesmos, vestindo a carapuça de metamorfose ambulante, e abrindo mão daquela "velha opinião formada sobre tudo", estou me debruçando sobre o feminino e já pensando em levar isso a sério pra seleções de mestrado e publicações de artigos. Tendo a concordar contigo no que falastes sobre o feminino e sua relação com nossa mente e sensibilidade.
(A propósito, o link fornecido está com falhas.)
Sigamos discutindo e contribuindo e falando de nós, de nossas vivências, que são de fato nosso lugar de fala.
abraços e beijos cheios de força pra luta.
Juliana.
Postagem indireta a pedidos.
ResponderExcluirComentário surgido depois de colocar o texto pra uma amiga no facebook (ela não conseguiu postar sozinha (deu tiuti no blog, rsrsrs)
Danielle Castro da Silva
gostei muito do texto, Diana Melo. Sinto que não há muito uma consideração masculina quanto às nossas questões a não ser como forma de condolências. Nem os culpo, até porque muitas de nós não pensamos a fundo na nossa condição de sermos mulheres. Digo com isto que o "ser mulher" traz algumas questões biológicas que não podem ser dissociadas do social, mas que são tidas como absolutamente naturais, como é o caso das cólicas e de outras consequencias. Do mesmo modo que algumas faces do masculino são compreendidas pelo social - e algumas, sendo mais absolutamente construídas que orgânicas, até são tidas como naturais - seria muito interessante haver um olhar mais detido sobre esses nossos aspectos que acabam virando um "fardo" como cólicas, cistos, miomas, etc, etc. Por exemplo, porque pra pararmos de ter cólicas ou menstruar como sei que já é possível através de fármacos temos de desenvolver uma saga atrás de um bom ginecologista? Eu, por exemplo, estou atrás de algum bom - e confesso que prefiro as mulheres, porque não confio muito em um homem que não seja meu namorado tocando no meu corpo - e tenho milhares de dúvidas...Enfim, as minhoquinhas pululam no meu cérebro....