segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

O abismo entre o asfalto e a favela


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Por
Alzira Gomes Roque da Silva e Keila Santos de Oliveira
Estudantes do segundo período de Direito da UERJ

O acesso à Justiça, apesar de ser um direito fundamental garantido a todos, de acordo com a Constituição de 1988, previsto no artigo 5.º, inciso XXXV: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, tendo o Estado como garantidor de conflitos, não tem sido efetivo na aplicação concreta deste direito. Diversos fatores foram determinantes para afastar a população carente do poder judiciário, como por exemplo, a consciência de que somente “os ricos” conseguem obter justiça, mas evidenciaremos o desconhecimento jurídico, assistência jurídica deficiente, delonga do serviço jurisdicional e socioeconômico.


Nas comunidades carentes do Rio de Janeiro, essa realidade é ainda mais complexa, pois o acesso à justiça é intrinsecamente relacionado ao fato que somente “a elite” brasileira é detentora deste mérito, sendo ela favorecida por poder assegurar os encargos devidos e não ser pré-julgada, além do descrédito do judiciário, bem como a demora da justiça, são algumas razões que impossibilitam o acesso a ela.

De acordo com Boaventura de Souza Santos, dados estatísticos indicam que, mesmo quando acredita ter direito a algo, a população carente mostra-se arredia e desconfiada:
“(...) dois fatores parecem explicar esta desconfiança ou esta resignação: por um lado, experiências anteriores com a justiça de que resultou uma alienação em relação ao mundo jurídico (uma reação compreensível à luz dos estudos que revelam ser grande a diferença de qualidade entre os serviços advocatícios prestados às classes de maiores recursos e os prestados às classes de menores recursos), por outro lado, uma situação geral de dependência e de insegurança que produz o temor de represálias se recorrerem aos tribunais”.

Há uma dualidade incontestável entre comunidades e asfalto, devido à distância socioeconômica que os separam profundamente. Contudo, o “Acesso à Justiça”, que deveria sanar os problemas referentes aos custos, não direciona muita das vezes aos pobres o direito de ação, o conhecimento de seus direitos e causas a pedir, não promovendo seu objetivo principal, que seria o cidadão ter a possibilidade de ingressar no tribunal de forma justa, célebre e eficiente. Mediante a isso, os pobres não procuram assistência jurídica gratuita e muito menos promovem a cabível ação legal, apesar de a Defensoria Pública prestar serviço de assistência gratuita.
A prestação judicial, em razão da morosidade processual, é um dos motivos que comprometem a busca pelo acesso a justiça, o que culmina na descredibilidade da prestação jurisdicional do judiciário e efetividade de acesso à justiça, que deve ser satisfatoriamente aparelhada na relação juiz e jurisdicionado.
 É preciso que haja mais visibilidade, conhecimento e informação sobre a existência desses meios legais, para que as pessoas dessas localidades conheçam e saibam onde procurar assistência e, acima disso, sejam assistidas por meio de campanhas de grande alcance que desmistificariam certos conceitos criados ao longo do tempo, podendo ocorrer por meio de palestras, encontros, mutirões, dentre tantos outros meios. Outra possibilidade é promover essas informações às escolas e centros educacionais sobre seus direitos, além da adição de políticas de aproximação. Assim desde a tenra idade, além de perpassar informações aos pais, as crianças, tendo esse tipo de informação, se tornarão cidadãos mais conscientes de seus direitos e deveres.

Assim, minimizariam-se consideravelmente as barreiras instauradas na consciência da população carente, que se sentirá acolhida devido à aproximação da comunidade ao judiciário, superando assim as falhas do positivismo, que serviu para afastar o Estado do seu objetivo, que é promover a justiça concreta a todos, sem distinção, e, de forma democrática, desmistificar e humanizar todo o aparato processual para os leigos, ofertando um provimento equilibrado, tempestivo, legítimo e efetivo, sem meras declarações poéticas.

Referência Bibliográfica

CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Tradução Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Fabris Editora, 1988.

 SANTOS, Boaventura Souza. Introdução à sociologia da administração da justiça. In: FARIA, José Eduardo. Direito e justiça. São Paulo: Ática, 1989. p. 48-49. 

SORJ, Bernardo. 2003. brasil@povo.com - A luta contra a desigualdade na Sociedade da Informação. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.



segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

A Escassez do acesso a Justiça a População Brasileira


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Assessoria Jurídica Popular – Uma Luz no Fim do Túnel.

Por Jéssica Montezuma Coelho
Estudante do segundo período do curso de Direito da UERJ

Ainda é latente a dificuldade encontrada ao procurarmos assessoria jurídica. Até quando possuímos os poderes aquisitivos para contratar um advogado e custear todos os futuros gastos que poderá vir a ocorrer, um processo pode demorar anos na justiça até que se resolva. Isso piora quando dependemos da assessoria jurídica pública. Conseguir ser assistido pela defensoria pública não é tão simples – vale frisar que se podem levar anos até que você consiga ao menos um parecer qualquer –  Nas cidades grandes, como Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo, ainda encontramos a possibilidade de pedir auxilio jurídico sem custos, mas existem muitos lugares que são remotos, como as áreas rurais, que esse acesso é inexistente, pessoas são vítimas nas mãos dos empregadores, exploradas, trabalhando em regimes similares a escravidão e não possuem nenhum auxilio e nem a possibilidade de mudar suas realidades.


É lamentável chegar à constatação que a justiça brasileira ainda possa ser tão omissa e ineficaz. Parte dessa ineficácia pode ser explicada pela quantidade de defensores públicos ativa, um estudo da DefensoriaPublica da União de 2014, apresenta um déficit de 66%  de defensores públicos federais em relação ao que seria ideal para um melhor atendimento a população brasileira. "Considerando as 140 milhões de pessoas no país que se enquadram nessa situação, segundo o levantamento, seria necessários 1.469 defensores públicos federais, enquanto o Brasil tem 506 espalhados pelas capitais e outros 40 municípios.” Segundo a Defensoria Publica da União.
É possível perceber facilmente o quanto é urgente a necessidade de uma atenção redobrada com a justiça brasileira. É Humanamente impossível, com tamanha baixa de defensores públicos, que todas as pessoas que recorrem sejam assistidas, também explica, em partes, a demora de um processo (tendo em vista que há um processo altamente burocrático para que o mesmo chegue as vias de fato). 
É baseado nessa situação, vista pela minha concepção, caótica, que surgem os projetos de assessoria jurídica popular, que reúnem advogados e voluntários para atender e auxiliar todos aqueles que necessitam de ajuda jurídica, um projeto que vem trazendo uma esperança para tantas pessoas e alivio ao ver seus problemas judiciais, suas injustiças sofridas e seus direitos que possam ter sido retirados sendo recuperados.
Vivemos em uma sociedade cada vez mais  individualista, em que não nos importamos mais com a dificuldade do outro, com as necessidades do outro, fechamos os olhos para muitas injustiças sofridas. Acomodamo-nos em nossas bolhas pessoais e não nos externamos as dores e dificuldades alheias, o que nos faz cada vez mais insensíveis e nos transforma em uma sociedade triste. Não possuímos mais compaixão com o outro, não possuímos o mínimo de ética para com o próximo.
É Uma luz no fim do túnel ver projetos como o de assessoria jurídica popular. Poder observar que ainda, mesmo que em uma escala não tão grande, ainda há quem se importe e se interesse que a justiça seja exercida e garantida para todos, a Constituição Brasileira nos garante isso, então tentemos fazer ao máximo por quem não consegue sozinho.

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Café Guaií e Quilombo Campo Grande


Por Davi Martins Furtado de Mendonça e Ricardo Loredo Teixeira
No dia 7 de novembro de 2018, o Quilombo de Campo Grande, acampamento pertencente ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra em Minas Gerais, foi alvo de uma liminar de despejo, aprovada por um juiz do estado. Ao todo são 450 famílias afetadas pela decisão, famílias essas que com esforço e empenho construíram no local um polo de produção de alimentos em 1760 hectares, desses, 1200 eram reservados a lavoura dos mais diversos alimentos, 40 eram destinados a uma horta agroecológica e 520 à produção de café, além de currais e casas. A decisão afeta vinte anos de trabalho conjunto das famílias.

É de suma importância ressaltar o papel da agricultura familiar para o abastecimento dos centros urbanos, uma vez que esse modelo é a principal fonte dos alimentos que chegam às prateleiras dos mercados das cidades. Contudo, é também alvo de severos ataques dos setores dominantes sedentos por terras, agravando a situação fundiária do nosso país, que é extremamente concentrada e improdutiva. A realidade do espaço rural atual é diametralmente oposta àquela prevista pela Constituição Federal, ao passo que elenca em um dos seus dispositivos - artigo 184 - a possibilidade de reforma agrária.
Os Sem Terra ocuparam por vinte anos o espaço de uma antiga usina, que por motivos fiscais, veio à falência. Desde 1998 o acampamento Quilombo Campo Grande era referência na agroecologia e na produção do café Guaií, reconhecido mundialmente. A ocupação se deu mediante um Decreto Estadual (365/2015) que previa a desapropriação do terreno da usina abandonada. Previsivelmente, os empresários e ruralistas se colocaram contrários ao acordo, e, por meio de uma liminar ordenaram o despejo das famílias, liminar essa aprovada pelo juiz da vara. O processo não está finalizado, cabe ainda recurso aos trabalhadores.

Em suma, é importante compreender para qual lado e de que maneira a justiça é orientada, assim, saltam aos olhos os diversos casos nos quais o acesso à justiça é negado ou constantemente embarreirado. Nesse sentido, a partir das discussões realizadas dentro do curso de extensão, é possível ver como a assessoria jurídica popular como uma das ferramentas na busca, por parte de grupos frequentemente rechaçados pela sociedade, como este, pela contempla dos direitos mais básicos frente aos abusos estatais e privados.
Davi Martins Furtado de Mendonça e Ricardo Loredo Teixeira são estudantes do 2° período da Faculdade de Direito da UERJ.