A cada hora uma mulher brasileira é agredida (7% por
estrangulamento). A cada dia morrem cinco mulheres no Brasil (boa parte delas
por familiares ou cônjuges). De 1980-2010 morreram 92 mil mulheres no Brasil
por violência de Gênero.
No dia 09 de março passou a vigorar a Lei nº. 13.104/15 a
qual estabelece o como crime hediondo o feminicídio. Assim fixando-se:
“Feminicídio
VI – [homicídio] contra a mulher por razões
da condição de sexo feminino:
§ 2o –
A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime
envolve:
I – violência doméstica e
familiar;
II – menosprezo ou
discriminação à condição de mulher.
[…]
§7º A pena do feminicídio
é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:
I – durante a gestação ou
nos 3 (três) meses posteriores ao parto;
II – contra pessoa menor
de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;
III – na presença de
descendente ou de ascendente da vítima.”
A tipificação do crime
levanta muitas críticas sob a ótica do aumento da punibilidade no campo do
direito. Contudo nos parece que estas são compreensões equivocadas diante da
realidade dos dados apresentados na introdução deste artigo. Neste sentido
afirmamos que o reconhecimento do feminicidio como crime é uma conquista dos
movimentos feministas no Brasil.
Isso porque estamos
falando de uma legislação penal que até 1940 admitia matar a mulher como “defesa
da honra”. E vale dizer que ainda encontramos julgados em que se observa o
abrandamento das penas tendo em vista serem os assassinos motivados por “violenta
emoção”. Estamos falando de redução da pena no estupro por contribuição da
vítima ao usar uma saia muito curta. Estamos falando de um nicho que pouco
aceita a presença de mulheres como advogadas penalistas. Logo, estamos falando
de uma lei penal que reproduz o patriarcado como sistema estruturante das relações
sociais de gênero, e o machismo como forma de dominação.
Encontramos no
cotidiano afirmações de que não há violência de gênero, uma vez que a mulher
ascendeu ao mercado de trabalho, que as desigualdades de gênero chegaram ao fim
quando o homem ajuda a cuidar da criança. É quase a tese de aceitar o machismo
como algo do jeitinho brasileiro!
Os dados são alarmantes, de um aumento da violência
em mais 230% nos últimos 10 anos. São mais de 44 mil mulheres, que entre 2000 e
2010, morrerão dentro de suas casas, tendo como autores seus ex-companheiros ou
companheiros. Fica evidente que a violência contra a mulher, não é uma violência
qualquer, ela sofre por ser mulher, por estar abaixo na estrutura de poder.
- Mas isso só acontece com quem é pobre!- Diz o
burguês acometido de sua falsa moral.
Segundo
estudos da fundação Perseu Abrão, publicados em 2013, no relatório “Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado”,
as porcentagens de mulheres com ensino superior completo e renda média que
sofrem violência doméstica similar as que possuem ensino fundamental e renda
mais baixa. Observamos que a violência de gênero não escolhe classe, nem educação,
atravessa todos os segmentos, é transversal. Nesse sentido afirmamos, a importância
de observar o patriarcado como um elemento estruturante da reprodução da
colonialidade do poder no mundo.
As mulheres chegaram ao mercado de trabalho,
mas numa sociedade alicerçada na divisão sexual do trabalho. A nós, cabe a
chamada dupla jornada de trabalho, após as mais de 8 horas diárias seguimos no
trabalho doméstico. Nos últimos anos, com a crítica feminista, os homens
começaram a compartilhar tarefas, mas a educação sexista ainda mantém uma
grande diferença no tempo despendido, enquanto as mulheres dedicam 25 horas
semanais para o trabalho doméstico, os homens dedicam apenas 10h (IPEA,2010). Ocupamos os campos de trabalho mais
precarizados, como no caso dos terceirizados, hoje 12 milhões no Brasil, dos
quais 70% são mulheres. Além disso os homens ganham em média 30% mais do que as
mulheres da mesma idade e nível de instrução.
Assim reconhecer o feminicídio como
crime é reconhecer que existem desigualdades de gênero no Brasil, e de que é
preciso políticas públicas para superá-las. É avançar no caminho de que as
nossas instituições não naturalizem e reproduzam as assimetrias entre homens e
mulheres como processos naturais. Em briga de marido e mulher o Estado deve
meter sim a colher!
Tendo a clareza de que essa conquista,
no plano normativo, está longe de ser revolucionária, mas que representa um
importante passo, assim como a lei Maria da Penha, no processo de acúmulo de
forças para o momento revolucionário. Ainda temos que vencer a educação
sexista, a heteronormatividade...etc.
Afirmamos por fim a centralidade de discutirmos gênero, aliado com o debate de classe e raça. Para inserirmos em nossas práticas cotidianas o feminismo como horizonte a se trilhar para a sociedade que queremos. Para outro mundo possível, no qual não caberão nem os falsos revolucionários com seu machismo!
E esse foi mais um março, mais um dia 08,
que marchamos gritando e tornando público tudo aquilo que nossos copos estão
cansados de sofrem, e anunciamos que a cada mês nosso grito ganha eco. E dentro
em breve ...não haverão mais meses que não estarão marcados de roxo!