Em 2012, o Brasil irrompe no
centro de uma história que não tardou a ser escrita. Se de um romance se
tratasse, estaríamos chegando ao auge de um dos capítulos definitivos para o
enredo. Como se trata da realidade concreta, estamos diante de um importante
momento da mobilização de um significativo setor da sociedade brasileira: o
serviço público federal.
O leitmotiv dessa história,
parece restar nítido, é a greve dos docentes das universidades e instituições
federais de ensino. Neste 17 de agosto, o movimento grevista completou três
meses de paralisação, sem ter muito o que comemorar, já que o governo encerrou
negociações sem que a maior parte dos professores aceitasse o acordo proposto,
a não ser o fato de ter sido o abre-alas de um quase que inesperado esboço de
greve geral do funcionalismo público.
O capítulo da conjuntura social e
política do país que ora se delineia é justamente aquele que aponta para um
sinal de alerta a toda a população. Longe de ser um símbolo de intransigência para com a sociedade brasileira, como muitos
insistem equivocamente em afirmar, trata-se de uma convocação para a reflexão
e, a depender do que se concluir, para a ação.
O Brasil entrou na década de 1990
esperando recuperar os vinte anos perdidos com a ditadura que durou de 1964 a 1985. Mas logo no
início de seu curso esperançoso, mesmo com constituição cidadã, eleições
diretas e os caras-pintadas, deparou-se com o flagelo da repressão estatal ao
movimento combativo de trabalhadores (como ficou patente na greve dos
petroleiros, em 1995, em que o movimento sindical sofreu um duro revés). E na
sua esteira, o contínuo desmonte do estado recém-(re)construído.
A greve que faz 164.650 docentes
do magistério superior e do ensino básico, técnico e tecnológico fecharem os
livros, guardarem o giz e tirarem o guarda-pó tem sua motivação na mesma ordem
de problemas que engajam não só os servidores técnico-administrativos e
estudantes das mesmas universidades, mas também servidores da saúde, policiais
federais, técnicos do INCRA, do IBGE e dos ministérios, fiscais do sistema
financeiro e profissionais das agências reguladoras; enfim, todos os servidores
públicos federais (SPFs).
E quais são estes problemas?
Certamente, a questão não é apenas salarial, como o governo está querendo,
falaciosamente, fazer entender ao jogar dados distorcidos sobre percentuais
inverídicos de reajuste (exemplo disto é a fábula dos 45% que, em verdade, só
virão – em três anos – para menos de 10% da categoria). O problema central é a
estrutura laboral e as condições de desenvolvimento do trabalho das mais de
trinta categorias paralisadas. Trocando em miúdos, o problema é o da concepção
de estado em que se está investindo, já que estas duas questões são
determinantes para a continuidade dos quadros profissionais no serviço público
e com qualidade. Nesse sentido, os últimos vinte anos de nossa história têm um
depoimento comum a dar, apesar das evidentes e marginais mudanças de marcha de
uma década para outra.
Sim, as trabalhadoras e
trabalhadores da educação estão discutindo o futuro da universidade pública em
nosso país. Mas esta não é a única pauta, uma vez que está em jogo o futuro da
educação como serviço público fundamental. No entanto, o mesmo pode ser dito,
por analogia, sobre a saúde e a segurança públicas, hoje, entre nós. E isto
para não se fazer referência a todas as demais funções “típicas” do estado
moderno. Quer dizer que estamos em um momento crucial para o desenvolvimento do
estado brasileiro e é isto o que os movimentos paredistas do presente discutem
para além de suas remunerações ao falarem de carreiras bem estruturadas e
condições dignas de trabalho.
Não é o caos nem o descaso que
marcam o ritmo da narrativa estatal contemporânea no Brasil, mas sim uma forte
herança de desestruturação. Defender conquistas para o funcionalismo público
(expressas na pauta unificada do movimento), sem aceitar retrocessos quanto a
direitos já consolidados, é o único horizonte possível para fazer com que esta
história não termine em tragédia social.
Conferir versão condensada deste texto, na seção Opinião do jornal paranaense "Gazeta do Povo":
- A greve dos professores, a universidade pública e o Estado brasileiro.
- A greve dos professores, a universidade pública e o Estado brasileiro.
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