domingo, 31 de janeiro de 2010

Poesitando (n)o Direito



Para manter a linha de reflexões poéticas sobre o Direito, ou melhor, sobre a ciência, dogmática e moralidade jurídica, resgato, do fundo da caixa de pandora de meu armário de relíquias perdidas, uma poesia que escrevi de maneira quase psicografada, como diz Zé Ramalho, sentando e deixando aflorar, numa torrente de emoções e idéias, o sentido de um caminho para refletirmos sobre nós: estudantes e profissionais do Direito. Afinal de contas, para que lado pende nossa balança?


Manifesto Crítico-Radical

O direito, meus caros,
Não está nos livros, nos códigos,
Nas salas de aula;
Não é falado ou escrito em bom português,
Latim, alemão ou inglês.

O direito, meus senhores,
Não habita os escritórios,
Não veste o tradicional paletó,
Não se enforca com a gravata
Nem se esconde na bela oratória.

O direito, meus patrícios,
O verdadeiro direito, habita o asfalto,
Os pés descalços e as sacolas da feira;
Tem graxa na roupa e cimento no rosto,
Sujeira nas unhas e casa de madeira.

O verdadeiro direito habita um mundo,
Um mundo que meus patrícios-senhores-caros
Des-conhecem.

Ali, onde a lei é a sobrevivência,
Onde o Estado coexiste com os Instados,
É que vais encontrar o direito, o verdadeiro
E maior direito.

Apressa-te!, Tu que agora é “magnânimo”,
Porque não é com latim que se faz justiça!

Avança, além de teu nobre e utópico condado,
Os plebeus te esperam ávidos, por justiça!

Só no povo e com o povo é que deves morar.
Ali, onde todos teus princípios e pré-realidades
Contradir-se-ão frente aos fatos expostos, dia após dia,
Aos teus admirados e trêmulos olhos.

Apressa-te, pois o conhecimento tem fome!
A febre e a justiça têm fome!

Joga-te, e não temes a queda – é grande o abismo
Entre a sala e a feira! – mas saibas, quando levantares,
E tocares nas macas pelos corredores,
Sentires o cheiro do peixe podre e veres as crianças
Pelos sinais, uma luz ofuscará os teus sentidos, e, finalmente,
Cegará a tua soberba e velha cegueira.

(Não te chamarei mais de patrício, senhor ou caro)

Os outros dirão que sois doido, profanarão que corrompes
Os milenares tratados dogmáticos...
Eu porém vos digo: “serás o mais sábio!”
Urge a universidade popular, o magistrado
Revolucionário, este pescador que te pesca do afogamento,
Parteiro... Todos eles habitam cada olhar, cada gesto e fenômeno
Do povo. Lá é tua casa e tua salvação,
Aqui, junto ao povo.

Assis Oliveira

Da biblioteca "Poesia crítica do direito"

5 comentários:

  1. EM breve teremos material para uma coletânea de poesias.

    Excelente, Assis!

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  2. Sugiro até o nome da cioletânea: ASSESSORIA É POESIA

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  3. Depois que a "cegueira" é curada, não dá mais para voltar atrás...É tentar outros caminhos distantes daqueles óbvios que de nós tanto esperam os que ainda veem (será mesmo que veem)o direito num pedestal, como um título de nobreza.

    É duro superar as próprias contradições para tentar amenizar as do mundo, mas é um exercício necessário, já que, como já dito, simplesmente não dá mais para voltar atrás e fingir que não viu o que de fato "É".

    Abraço em tod@s!

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  4. E lembrar que a "cegueira" nos sonda sempre. O ver é temporário e requer a prática de um questionamento constante.

    O blogue ajuda bastante nesta tarefa e os amigos que compartilham esse pensamento, também.

    :)

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