Olhava o barulho das escuras águas salgadas e escutava a bonita chuva amazônica que caia sobre a horta de cactos daquela casa enquanto perguntava o que o direito ensina errado. Afinal, o Direito precisa ser vislumbrado a partir de uma perspectiva ecológica no que se refere a uma integração entre os diferentes saberes e entre estes e a natureza. Consolidando, dessa maneira, um processo duplo e dinâmico.
Mas, o fato é que a natureza tal qual o destino, só pode revelar a verdade que cada um traz dentro de si. Assim é que, não posso dizer o que o Direito ensina errado. Somente o que o Direito me ensinou errado. Tendo esta pergunta em mente, a minha resposta é absoluta: nada. Não houve nada que o Direito me ensinasse errado porque eu jamais permiti que assim o fosse, porque eu só penso o direito com os olhos do amor.
Ao contrário do que nos diz a fabulosa Hannah Arendt, acredito que o amor possa ser utilizado para uma ação transformadora no mundo dos espíritos sem ser desvirtuado. Contanto que se tenha em mente o risco de que o amor que liberta pode se tornar uma paixão que aprisiona ou um fetichismo maldito que nos cega.
Sabendo disso, podemos alicerçar o nosso ser amoroso, estudante de direito, em uma educação que é ato de amor como diz Paulo Freire. Baseados, sobre maneira, em duas palavras: alteridade e diálogo.
A “alteridade” remete a idéia de alterar, alternância. A prática educativa é um acontecimento que precisa dessa espécie de inversão na medida em que demanda a existência de sujeitos. Não existe ser humano que saiba tudo, nem outro que se assemelhe a um buraco onde será depositado o conhecimento. De nada adianta leis positivadas, se não tivermos homens e mulheres com a vida em seus ouvidos, protejando-se para o eterno e com disposição para mil batalhas pelo humano. Não pelo Direito o qual deixamos incontáveis vezes e ainda na Faculdade, que nos desumanize. Mas, pelo humano.
A nossa realidade é o horror dos dias em que seres pequenos e frágeis dormem nas calçadas frias da cidade. Horror que não nos escapa os olhos, pois estamos conscientes da vida. Não precisa que haja morte para tornar a vida feia. Basta mortificá-la ou esquecer o quanto ela traz sentidos à nossa existência.
Por assim ser é que, conscientes da realidade, precisamos revolucioná-la. Para isto é preciso haver comunicação entre homens e mulheres.
Para a comunicação efetiva se faz imprescindível o diálogo. Este traduz a idéia de compartilhamento de opiniões com vistas a problematização do conhecimento aliado ao nosso tempo, compreensão mútua da realidade e transformação, ação, a partir dessa experiência de encontro. O diálogo em sentido verdadeiro não é simples jogo de palavras, mas exercício de alteridade entre humanos e busca de intervenção na própria estrutura em que se funda para resignificação das palavras e em conseqüência, do mundo. Dessa maneira, o diálogo se aproxima da política.
É certo que o social e o político são fonte de descrença em nossos dias e perderam a chama de seus significados precisos. No entanto, negá-los seria acreditar em todas as fatalidades que estão previstas, não agir para a purificação espiritual ou ter fé extrema que as energias cósmicas mudarão tudo sem que nos movamos.
Ao ser humano, além da possibilidade do sonho, foi dado a escolha e a atitude. Cabe a cada um(a) descobrir qual a verdade que vem disto: a utopia ou o devaneio.
(Texto escrito e apresentado por ocasião da Semana do Calouro 2009 do Centro Acadêmico de Direito Edson Luís da Universidade Federal do Pará)
Mariana, a mais waratiana das ajupianas das terras mais ao norte, deixa uma linda mensagem de reflexão sobre a potencialidade do afeto na ação social e construção humana. Sem dúvida, o amor, o diálogo e a alteridade constituem uma trinca emancipatória para o reencontro com a vida. Palmas a Mari-Mari, nossa eterna wiii!
ResponderExcluirMuito legal essa postagem, Mariana!
ResponderExcluirAcreditar nas possibilidades que o Direito pode me permitir enquanto ser humano, me fez nele continuar. A busca pela Beleza e pela Felicidade* através do Direito passa necessariamente pela compreensão do Outro-a alteridade-, como você bem lembrou.
E educação como ato de Amor...Uma lição que precisa ser lembrada.
*Postagem do Assis: Como formar uma AJUP?
Mariana e leitor@s
ResponderExcluirBem lúdico teu texto, gostei!
Achei ele bem próximo do Axel Honneth, da Escola de Frankfurt, que também propõe a crítica a partir da alteridade e do amor.
Veja este linque:
http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2665763.xml&template=3898.dwt&edition=13200§ion=1029
Mariana,
ResponderExcluirestou aqui, tentado escrever uma proposta de estudo sobre o direito que se ensina errado e a luta das mulheres para modifica-lo... a partir de um estudo etnografico das açoes desenvolvidas no Curso de Direito pelas estudantes da UNB e pelos estudantes que com elas se solidarizam, porque tambem se sentem aprisionados pelas relaçoes de genero hegemonicas.
Sem perder de vista que tenho que imprimir a esse texto um carater dito cientifico, ou seja, nao posso falar que o que me move 'e a insurgencia mais apaixonada, mais visceral, que me d'oi a carne, o teu texto me inspira a nao esquecer nunca o que realmente d'a sentido a tudo isso. A construçao de terrenos para que o amor possa crescer...
Obrigada