quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

O teatro e o ensino do direito (3)

Reflexões de um jovem professor sobre a sala de aula

Por Luiz Otávio Ribas

Um problema percebido pelos professores é a dificuldade de ser compreendido, de se fazer entender. Se por um lado, nos esforçamos em encontrar mil justificativas no temperamento dos estudantes; por outro, não escondemos a frustração que decorre desta comunicação.
Não há grande preocupação em se implicar como emissor. Perdem-se horas e mais horas atribuindo os problemas a desatenção dos estudantes, o desinteresse, ou até, para alguns, a incapacidade de entendimento. As ambiguidades, os erros conceituais, o desconhecimento sobre assuntos específicos, tudo é absolutamente negado ou ignorado.
Existe grande preocupação dos professores em justificar perante seus colegas suas atitudes. Mas, não é preciso grande esforço. Afinal, há um senso comum pedagógico que a punição da nota baixa, a reprovação, ou o sermão, são sempre indicados e infalíveis. Sob pena do estudante "montar em cima" e reverter o processo hierárquico do poder da autoridade.
É preciso diferenciar a autoridade intelectual do autoritarismo. Aquele que aproveita seus conhecimentos prévios para planejar a metodologia de ensino e relatar os resultados da comunicação, serve-se da autoridade de sua posição e títulos para ampliar o seu espaço de diálogo - nas faculdades, jornais, blogues, organizações comunitárias e movimentos sociais. Aquele que aproveita seus cargos e títulos para ignorar a importância da reflexão pelo emissor sobre o processo comunicativo e as possibilidades de interpretação pelo receptor, adota postura autoritária, porque não comunica, mas estende sua necessidade de autoafirmação.
Pensar o processo pedagógico como comunicação significa extrapolar os limites da sala de aula. Transforma professores e estudantes em comunicadores - no mundo da cultura. Assim, extrapola também os limites da linguagem formal, racionalizada, cientificizada, que é utilizada nas faculdades.
A educação popular, neste sentido, significa este passo além. Os sujeitos educador-educando e educando-educador revolucionam a educação como uma prática-ação cultural para a libertação, como quer Paulo Freire.
Importante pensar o que é necessário fazer na sala de aula. Transformar o espaço em uma roda de capoeira, numa oficina de teatro, num fórum de discussões e debates, entre outras possibilidade, dissolve as paredes dos edifícios, do medo, do silêncio e da apatia.
Repetiremos o ato, pois o argumento convence, mas o exemplo arrasta.

O teatro popular pensado por Augusto Boal provoca esta mudança de atitude. Se todos somos atores, até mesmo os atores, em qualquer lugar, inclusive nos teatros, é preciso pensar a aula como uma peça. Assim, romper com a ficção dos exemplos, ainda, com a tragédia das aulas-auditório - que divide aquele que fala, do papel daqueles que ouvem.
Digo aos céticos e cínicos: meu sonho é real.

8 comentários:

  1. Quando abrem as inscrições para estágio com o professor Luiz Otávio Ribas?

    Que máximo essa sua postagem!Eu fico tão feliz quando fico sabendo de professores/educadores comprometidos com o que ocorre durante o processo de ensino-aprendizagem. Preocupados o suficiente para perceber as falhas, as incongruências do ensino-aprendizagem e tentar encontrar meios de superá-las, em conjunto com o estudante.

    Essa postura, da parte do professor/educador, requer um grande exercício de alteridade da parte deste e até de coragem para descer do pedestal.

    Você poderia era escrever uma cartilhinha com estas suas experiências, Ribas...

    =D

    Xeru!

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  2. Confesso não ter muitas palavras.

    É profundo a transformação de sonhos em realidades. Como disse no twitter, me sinto arrastado.

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  3. Irretocável o texto. Nada como arrastar, pelo exemplo, tantos céticos, já que aos cínicos só resta o mau agouro.

    Urge formarmos uma ampla frente de discussão sobre a o ensino jurídico de forma a revolucioná-lo, lembrando que a transformação deste ensino implica não só a mudança das formas (o exposicídio necessário naquilo que sói prevalecer a exposição nua e crua) mas também uma brutalmente radical mudança dos conteúdos. Pensemos nisso, ó, sensíveis pensadores/práticos do direito!

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  4. Um mini-curso sobre ensino jurídico nesta perspectiva? Crítica, crítica...crítica. Críptica?

    Eu acho que aqui neste blogue tem professores suficientes para algo assim... E educandos, também!

    ;)

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  5. Warat, no "Manifestos para uma ecologia dos desejos" diz:

    "Em 20 anos de docência, adverti que um professor precisa ser um pouco ilusionista. Empregar uma didática do imaginário, mostrando que para mudar a vida, é preciso reinventar as ficções. Temos que reinventar a linguagem se queremos desenvolver a democracia. Ela é impossível com homens estereotipados. O homem adormecido, sem efevercências, não é democrático. Um esteriótipo não pode portar incertezas, nem aceitar as diferenças e os diferentes. (...) Não existem jogos didáticos sem afetos. (...) O prêmio de um professor é a alegria, descobrir nos outros o desejo de sentir"

    O exemplo arrasta, contagia, inebria, excita ...
    O teu sonho é o nosso sonho!

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  6. Nayra, pelas minhas contas já podemos montrar uma faculdade "criptica" (ou carnavalizada, como diria Warat) de direito só com o nosso povo da AJP.

    Abraços

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  7. E por que não, Vladimir?

    =)

    O mini-curso poderia ser um dos pontos de partida. Valeria à pena sonhar/realizar algo neste sentido e, pegando carona no esquisito e provocador neologismo do caro Pazello, acredito que a AGIRANÇA é, de fato, o princípio propulsor entre os participantes do blogue...

    E existem muitos pontos de contato entre os pensamentos aqui apresentados, ainda que não totalmente coincidentes, por que não apostar em um dos que parecem mais evidentes: o ensino jurídico, ou, a crítica ao ensino jurídico?

    É algo a se pensar.

    Abraços!

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  8. A crítica do ensino jurídico, tal qual Ribas coloca, é uma crítica em exercício prático de criticidade cotidiana e confrontação as hegemonias "normalizadas".
    Começa pela destituição desta "palavra feia" chamada ensino jurídico, por, penso, educação jurídica, para pensá-la na indissociabilidade - do ensino, pesquisa e extensão -, na radicalidade de sua função social - servir ao povo e as questões sociais relevantes - e, por fim, de sua metodologia - com a inserção das artes (e da crítica as artes críticas) como linguagens educacionais por excelência, e de outros modelos de avaliação.
    Penso, talvez, que um passo fundamental nesse processo, a nível curricular, seja a inserção da Licenciatura Jurídica, como disciplina ou formação adicional.
    Não sei porque até hoje é tão "normal" só haver formação para bacharelado no direito. Ou seja, a formação do educador jurídico não é algo relevante, talvez porque se entenda que ele deva já nascer com o dom, ou só precisa decorar manuais para expor leis, problemas e soluções... ou seja, mais-do-mesmo.

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