domingo, 12 de junho de 2011

Levante sua voz


mijam em nós e os
jornais dizem: chove!

Já fora afirmado aqui no blogue, que Lênin esbravejando da sacada do palácio não faz mais revolução. Tal provocação nos convidava a pensar uma outra comunicação, uma contra-comunicação, um modo próprio, popular de se comunicar, em tempos de Intenet, Tv, etc.

A pergunta que é central, dentro dessa discussão, é como o povo pode se reconhecer nesses meios de comunicação, se ele não a constrói? É certo que a comunicação vai para além desses grandes instrumentos (tv, rádio, internet, jornais, revistas) e passa desde uma reunião de trabalhadores insatisfeitos com suas condições, até por um ato público, uma manifestação em que se transmite alguma idéia através do poder de mobilização. Porém, não podemos negar a influência dos grandes meios que, pelo seu alcance, são um dos principais responsáveis pela internalização da ideologia dominante.


A Necessidade de um espaço próprio, legítimo e popular se faz ainda mais presentes para os movimentos sociais e populares. Não é novidade alguma que a mídia serve como instrumento de deslegitimação e criminalização desses movimentos. Quando há algum espaço - o que é raro - que não vá nesse sentido, geralmente descontextualiza-se, deturpa-se o caráter do movimento, descaracterizando-os.

Tive uma oportunidade recente, por ocasião, do Encontro Regional de Estudantes de Comunicação (ERECOM), realizado aqui em teresina, de facilitar junto com a ENECOS (Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação) uma oficina sobre comunicação popular com uma ocupação urbana que, inclusive, é acompanhada pelo CAJUINA (Centro de Assessoria Jurídica Popular de Teresina). No diálogo com os ocupantes ficava claro que mesmo o mais bem "ameno" meio de comunicação que entrou em contato com o Movimento, queria apenas adaptá-lo a sua visão (Talvez pelo fato de ser um prédio abandonado pelo poder público, alguns ataques por parte da mídia foram mais amenos), quando não o criminalizava diretamente; sendo relatado por uma ocupante, inclusive, que uma repórter queria ditar as respostas que seriam divulgadas na TV. Espaço maior, claramente, sempre era dado ao poder público. Após o diálogo, tentou-se, na oficina proporcionar meios para a comunicação do próprio movimento, interna e externamente, com jornal-mural, fotos, depoimentos em vídeos feitos pelos próprios ocupantes.


foto tirada ao final da oficina.

Nesse sentindo, muito interessante o vídeo "Levante sua voz", produzido pelo Coletivo Intervozes:


O Mesmo Coletivo, há alguns dias, se manifestou após o Ministério das Comunicações divulgar lista dos detentores de outorgas de rádio e TV no Brasil. Só a título de exemplo, o Coletivo coloca que 21% dos Senadores e 10% dos deputados federais são concessionários de rádio e TV. Fácil perceber que não vai vir do Congresso a iniciativa em questionar essas concessões, nem muito muito menos serão esses meios de comunicação que fomentarão uma comunicação popular. O manifesto na íntegra pode ser lido aqui.


Outro documento interessante para esse debate é Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) que tinha como objeto, entre outros, atacar "Omissão legislativa inconstitucional em regular a proibição de monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação social". Ação essa, não sem surpresa, arquivada por ilegitimidade ativa.

Discutir comunicação alternativa, assim, passa desde uma produção de formas de comunicação dentro dos movimentos - seja para diálogo interno, seja para externalização de suas práticas - e necessariamente, passa pela contestação da comunicação dominante.

Quem sabe assim, construindo essa contra-comunicação, consigamos vivenciar, frequentemente, um fato pelo qual, Vinicius de Moraes já "poetizava": o operário ser escutado pelo próprio operário.

(...)

E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.

E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.

(...)

Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.

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Importante conferir:


4 comentários:

  1. Muito bom o tema, de grande relevância para os movimentos o tema da comunicação, reproduzi teu texto.

    Abraço

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  2. Texto excelente, Lucas!

    Realmente, nos últimos dias temos estado sintonizados com as mesmas preocupações. Você, o Assis e eu temos escrito dialogando francamente. Escrevi minha última postagem sem ler a sua...

    Aqui, no Paraná, estamos estudando a melhor forma de criar novos canais de comunicação: rádios livres, tevês comunitárias, jornais de bairro e assimo por diante. Em alguns espaços, temos pensado nisso.

    É um problema de primeira ordem. Precisamos nos qualificar para enfrentá-lo. Leituras críticas, práticas diversificadas, entendimentos políticos. Continuemos remando!

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  3. Ô,Lucas!

    Que bom que está colocando pra fora algumas de suas muitas inquietações!Um ajupiano experiente como vossa pessoa tem mais é que compartilhar essa massa de informações, opiniões e sensações que andou amadurecendo. Fora que esta mente inquieta e criativa é algo indispensável por aqui. Estou acompanhando suas postagens e as dos demais colegas( apesar de andar meio silenciosa).

    Beijo grande!

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  4. Belo texto companheiro. A questão da Comunicação hegemônica-disputa dos meios - comunicação alternativa é um tema muito interessante para a AJUP.

    Muitas vezes, a articulação e o uso de mídias alternativas e/ou utilização dos das brechas existentes nos meios hegomônicos são fundamentais para o sucesso das impreitadas dos movimentos dentro e fora dos tribunais.
    E mais, quando debatemos criminalização dos movimentos sociais e do pobre, parece impossível não nos remeter a esta temática.

    A própria tarefa da educação jurídica popular também pode se encontrar com o uso de meios alternativos.

    Nesse sentido, é interessante acumularmos mais discussões a esse respeito nos nossos espaços de formação.

    Aqui em Teresina, participamos, CORAJE e CAJUÍNA, de um espaço em conjunto com a ENECOS-PI, I seminário sobre extensão em comunicação comunitária da ENECOS, com um indicativo de construir conjuntamente um projeto de extensão.

    Além disso, existem algumas AJUPs que já tiveram práticas envolvendo a comunicação, como, por exemplo o trabalho do Isa Cunha com rádios comunitárias, o CAJUÍNA na construção das DEMOCONs (semana pela democratização da comunicação)

    Pensando nisso tudo, seria interessante termos futuramente um espaço para troca e sistematização dessas experiências. Que acham?

    Abraços ajupianos!

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