quarta-feira, 31 de março de 2010

Entre coronéis e pistoleiros: um ano sem Manoel Mattos

Coluna de Ana Lia Almeida

Há mais de um ano atrás, mais um caso de violência e impunidade chocou o Nordeste:  Manoel Mattos, 40 anos, advogado, dirigente do Partido dos Trabalhadores em Pernambuco, foi assassinado com tiros à queima roupa no litoral da Paraíba (24/01/2009), durante uma confraternização de amigos em Pitimbu – Praia Azul.
Seu assassinato está ligado a represálias em função de sua militância no enfrentamento aos grupos de extermínio na fronteira entre os estados da Paraíba e Pernambuco, na região nordeste do Brasil. A dificuldade na punição destes bandidos atesta a fragilidade da democracia e falência de funções importantes do Estado em nosso país, como a Justiça.

Algumas iniciativas por parte do Estado, a partir da mobilização da sociedade, fizeram com que fossem instauradas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) em âmbito nacional e estadual para apurar, entre outras, as freqüentes ações ligadas a grupos de extermínio. O caso também chegou à Comissão Interamericana de dh (OEA), sendo concedida proteção a Manoel Mattos no ano de 2003.
Tais bandidos agem na divisa destes estados, mais intensamente nos municípios de Juripiranga-PB, Alhandra-PB, Caporaã-PB, Pedra de Fogo-Pb e Itambé- Pe, Goiana-PE e Timbaúba-PE. Têm como foco o extermínio de meninos de rua, supostos marginais, homossexuais e trabalhadores rurais. Há indícios de que esses grupos sejam patrocinados por comerciantes da cidade, com a conivência e inclusive participação de algumas autoridades policiais e judiciárias locais na execução de tais crimes.
Ações como esta são justificadas em nome de uma mentalidade facista que concebe estes criminosos como defensores da sociedade e responsáveis por uma espécie de "limpeza" social. A fronteira entre os estados, no contexto, é um fator de impunidade, já que os crimes são cometidos na jurisdição de um estado, e os corpos são jogados no outro, dificultando a atuação  das autoridades por questões de competência de investigação.
O envolvimento de Manoel Mattos com a questão se deu porque ele era um advogado articulado com coletivos de defesa de direitos humanos, cuja atuação começou a enfrentar as ações criminosas. Em 2000, foi eleito o vereador mais votado no município de Itambé-Pe, cidade bastante atingida pela atuação dos grupos de extermínio. Seu mandato investigou e denunciou publicamente com afinco tais crimes, denunciando os “justiceiros” que atuavam na região, sofrendo, por causa disso, atentados e ameaças que culminaram no seu assassinato.

As entidades mobilizadas diretamente no caso (Dignitatis Assessoria Técnica Popular/PB, Justiça GlobalMovimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH -, A-Colher - Centro de Estudos e Ações em Direitos Humanos, Centro Dom Hélder Câmara – CENDHEC/PE), estão lutando para que o caso seja assumido pela Justiça Federal. A federalização está em discussão no Superior  Tribunal de Justiça há 4 meses. Isso evitaria a atuação exclusiva das autoridades locais, entendendo que o sistema de justiça local não está se empenhando de modo suficiente e eficaz no enfrentamento ao dramático problema.

Há mais de um ano foi Manoel Mattos. A Sra. Nair Ávila, sua mãe, foi perseguida quando voltava de uma audiência em Pedras de Fogo, necessitando da escolta da Polícia Militar para retornar em segurança à sua residência. É preciso que fiquemos atentos para que ninguém mais seja encurralado entre coronéis e pistoleiros.
  
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Um comentário:

  1. É muito triste que a situação chegue a esse ponto.

    Não consigo nem me expressar por palavras quanto a isso...

    Mas obrigada por nos lembrar.

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