quinta-feira, 17 de março de 2011

Papo de Cinema

O presente espaço destina-se a apresentar filmes que tenham linha de interlocução com a educação popular em direitos humanos e, de forma complementar, com o trabalho em AJP/AJUP, propondo também questões que possam motivar o debate no blog e servir de orientação para o uso dos filmes nas práticas educacionais desenvolvidas.

O primeiro filme chama-se “Juízo”, dirigido por Maria Augusta Ramos, mesma diretora do documentário “Justiça”. Em ambos a diretora utiliza câmera fixa para registrar as cenas cotidianas da prática judiciária e de internação-prisão no estado do Rio de Janeiro.

Em “Juízo” há o acompanhamento da trajetória de adolescentes (masculinos e femininos), todos de classe popular, do instante da prisão (não sei quem popularizou apreensão, usado só para objetos/coisas) até o internamento, com cenas que mostram a atuação de juízes, promotores, defensores, agentes e familiares, na complexa rotina de por em prática os direitos das crianças e dos adolescentes.

Por óbvio, o filme é indicado para discutir as práticas e os discursos em torno das maneiras de materialização institucional dos direitos das crianças e dos adolescentes.

Desde o começo são mostradas cenas de como a juíza do Juizado da Infância e da Juventude realiza os julgamentos dos adolescentes acusados de ato infracional, ao que se deve atentar: (a) comportamento da juíza, sobretudo no modo como (não) se relaciona com o promotor e a defensora durante as audiências, de como decide os casos e também as posições moralistas que impõe aos adolescentes; (b) a linguagem dos processos judiciais e os efeitos produzidos nos adolescentes quando lidos durante as audiências; (c) o apego a literalidade da lei para fundamentação das decisões judiciais o que escamoteia interpretações encharcadas de padrões morais de família e adolescência que rechaçam completamente a possibilidade de se compreender os contextos e os dizeres dos adolescentes.

Aliás, com relação à participação dos adolescentes – todos sendo atores-adolescentes que vivem em condições sociais similares – é preciso refletir sobre o modo como o sistema de internação implementa diversos procedimentos que realizam verdadeiro desfiguramento da identidade pessoal dos adolescentes, o que leva a algumas indagações que o filme apenas mostra em cenas: (a) Quais os impactos do corte de cabelo e da substituição do nome pelo número de identificação para o processo de re-socialização dos adolescentes em medidas sócio-educativas de internação?; (b) Como é o aproveitamento do tempo pelos adolescentes no período de internamento, e no que isto implica?; (c) Em que condições estruturais e de recursos humanos se encontram os estabelecimentos mostrados pelo filme (e nos outros estados do país)?

No final de tudo, fica a sensação-reflexão de quantos absurdos são produzidos nas salas fechadas dos “operadores adultos do direito”, sobretudo quando se colocam como porta-vozes privilegiados do conhecimento sobre a infância e adolescência e buscam legitimar suas ações moralistas como medidas justificadas juridicamente.

3 comentários:

  1. Olá,Assis!

    Obrigada pela dica. Interessante que um amigo paranaense me indicou este documentário esse ano também, e, por acaso, ele também é colunista do blogue ( professor Ricardo Pazello).

    Agora fiquei na obrigação de assistir, mesmo. Duas indicações de peso!

    E vou recomendar.

    =)

    Abraços!

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  2. Assis! A idéia de uma coluna específica sobre cinema aqui no blogue é excelente! Quero saber se a franquia está sob licença copyleft (ou quiçá creative commons!). E que tal o nome "Cine-clube AJP", seguindo a linha dos amigos cineclubistas da RENAJU!

    Abraço

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  3. Diehl,
    A proposta é solidária e aberta a novos autores. O nome que você sugeriu fica mais expressivo dentro do contexto do blog, acatado também!

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