quinta-feira, 5 de maio de 2016

Assessoria Jurídica Popular: nada deve parecer impossível de mudar

Prosseguindo a divulgação dos textos elaborados para a disciplina tópica Assessoria Jurídica Popular, da Universidade Federal do Paraná, ministrada por Ricardo Pazello, a coluna AJP na Universidade desta semana divulga uma reflexão sobre as dificuldades e potencialidades da prática de Assessoria Jurídica Popular, em especial as reflexões que se voltam à definição do próprio direito e as limitações/aberturas de uma atuação dentro da ordem. As autoras, Aline Carvalho (antiga integrante do SAJUP-PR), Amanda Gennari, Heloísa Kruger e Fernanda Macedo são formadas pelo curso de direito da UFPR.

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Assessoria Jurídica Popular: nada deve parecer impossível de mudar

Aline Carvalho
Amanda Gennari
Heloísa Kruger
Fernanda Macedo

A massificação e coisificação de grande parte da população, a qual vê, de geração em geração, a anulação da condição de sujeito de sua própria emancipação, dão corpo à grande desigualdade e exclusão social tão presentes na nossa realidade, não mais tão desapercebida aos olhos nus de qualquer cidadão brasileiro. Analisando tal contexto é de se presumir uma forte atuação de uma assessoria jurídica popular.
Obviamente, também considerando que tal presunção estaria por demais inocente, tendo em vista o Estado Capitalista sobre o qual se constrói a nossa sociedade, é que a temática da assessoria jurídica popular, em especial, toma-se muito mais complexa do que qualquer uma dessas teorias do direito.
Diante disso, vêm surgindo novas formas de se utilizar o direito em favor desses grupos oprimidos por um Estado capitalista e neocolonialista. Essa nova concepção social do direito se afigura em algumas designações já desenvolvidas por estudiosos, como o uso alternativo do direito, o direito alternativo e o direito insurgente.
O uso alternativo do direito seria uma espécie de atuação progressista dos operadores do direito (ou positivismo de combate), como no caso do movimento encabeçado pelos juízes gaúchos. O direito alternativo, por sua vez, consistiria em práticas e produções jurídicas por intermédio das próprias comunidades marginalizadas e oprimidas. Por fim, o direito insurgente viria como um conceito mais amplo, representando a prática jurídica comprometida com a classe excluída do sistema capitalista, partindo do pressuposto de que direito oficial não resolve as injustiças sociais, questionando-o e rompendo com ele.
Não por outro motivo é que a concepção do pluralismo jurídico também aparece como fundamento da assessoria jurídica popular. Uma das premissas básicas do pluralismo jurídico é a tentativa de (re)aproximação entre o direito oficial, vigente, posto, e as inúmeras interações sociais que ocorrem atualmente no nosso país. Essa corrente, amplamente debatida por grandes estudiosos brasileiros, propõe a busca de outras fontes do direito que transcendam os meios jurídicos convencionais, dando espaço para novos atores sociais que, em seu âmbito de atuação, também criam fenômenos jurídicos próprios. Se o que se almeja é um direito efetivamente democrático, ele deve absorver os influxos da própria sociedade civil.
É a partir daí que se deve conceber o direito insurgente como o principal instrumento dos grupos e movimentos historicamente oprimidos, se desenvolvendo paralelamente ao direito oficial. Um direito construído na periferia pare contestar a ordem estabelecida.
No entanto, o que se pretende na presente análise é avaliar qual e aplicabilidade prática dessas teorizações, através da atuação da Assessoria Jurídica Popular, desde o seu embrião nos núcleos de extensão das universidades, cuja principal proposta é a conjugação do saber acadêmico e científico com o saber popular. Para que isso seja possível, a AJUP procura levar às comunidades algo para além desse direito oficial, ensinado nas universidades, uma vez que este se encontra muito distante das diversas demandas que o grupo costuma se deparar na realidade.
Na prática, o maior desafio é romper com as barreiras, sejam elas burocráticas, institucionais, a falta de financiamento, o poder significativo utilizado pela mídia que apenas corrobora com a manutenção da exclusão social, ou, inclusive, o próprio direito que, ao considerar iguais os desiguais, acaba por validar a exploração histórica de uma classe por outra.
Assim, com vistas a essas barreiras e teias de proteção do sistema fechado, como se dará a aplicação do direito insurgente? Dentro ou contra tal sistema? Seria possível uma atuação simultânea dentro e fora? E, se optássemos por uma atuação exclusivamente fora e contra o sistema capitalista, de que forma poderíamos gerar os frutos almejados pela assessoria jurídica popular?

Verdadeiramente, não há uma resposta para todas essas interrogações que permeiem a atuação do advogado popular. Seja dentro ou fora do sistema, o incentivo à produção teórica e ao estudo do tema e a inserção do debate e da prática extensionista nas universidades são terminantes essenciais para uma atuação junto às comunidades marginalizadas, uma atuação não limitada ao mero peticionismo, mas comprometida em promover todas as medidas que possibilitem a recuperação dessa condição do sujeito do sua própria emancipação.

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