Na coluna AJP na
Universidade desta semana, lemos o texto de Ana Cristina Follmann, graduada em
direito na UFPR. Nessa contribuição, que foi escrita para a tópica “Assessoria
Jurídica Popular”, continuamos debatendo a temática do Teatro do Oprimido, mas,
desta vez, com um enfoque que tenta aproximar e apontar as semelhanças entre a
proposta de Augusto Boal e das Assessorias Jurídicas Populares: em especial na
busca da libertação por meio da ação dialógica.
***
Teatro do Oprimido e Assessoria Jurídica Popular: duas
maneiras alternativas de ver e tocar a realidade
Ana Cristina Follmann
Metodologia desenvolvida
por Augusto Boal no início da segunda metade do século XX, o Teatro do Oprimido
busca utilizar-se da arte para trazer à tona discussões e trabalhos políticos e
sociais, procurando atuar como ferramenta da transformação social.
Das pesquisas teatrais
realizadas durante seu exílio consequente do regime militar que assolava o
país, Augusto Boal procurou desenvolver uma espécie de teatro em que se desse a
transformação do espectador em sujeito ativo, para que assim aquele pudesse
passar do papel de consumidor do bem cultural para o de produtor de cultura.
Estimula, portanto,
"a troca de experiências entre atores e espectadores, através da
intervenção direta na ação teatral, buscando a análise e a compreensão da
estrutura representada e a busca de meios concretos para ações efetivas que
levem á transformação daquela realidade"' [1].
A partir de situações
construídas com base em problemáticas vivenciadas por grupos socialmente
oprimidos, o expectador-ator deve, a partir de suas experiências e da realidade
observada e vivida, apresentar soluções.
Desta maneira, o
teatrólogo inovou na maneira de se ver e de se fazer teatro, transformando
indivíduos em sujeitos ativos que possuem a capacidade de repensar seu papel
como cidadãos, tomando-se sujeitos em busca da justiça social.
O Teatro do Oprimido é uma poética para
liberação. Todos estão livres para experimentar as mais diversas possibilidades
dramáticas. Mas não se esgota na dramaturgia. O TO, em todas as suas formas,
busca sempre a transformação da sociedade para a libertação dos oprimidos. [2]
Pode-se concluir que
nada mais é do que educação popular, encorajando o sujeito a assumir
posicionamentos e promover ações sobre o meio no qual se insere, visto como um
"ensaio geral da Revolução, devendo terminar sempre na construção de um
modelo de ação futura". [3]
A Assessoria Jurídica
Popular, por sua vez, procura se inserir em novos espaços, principalmente
aqueles que foram renegados, ao longo do tempo, aqueles que se vem à margem do
direito: do sistema jurídico e da tutela de seus próprios direitos. Estes,
portanto, são os oprimidos.
Ao se inserir, porém,
aqueles que estão promovendo a Assessoria Jurídica Popular não procuram
simplesmente dar soluções, levar respostas prontas, mas perceber a realidade
daquele espaço, ouvir e não somente ensinar, mas aprender.
"A assessoria
contra a massificação e a dominação concebe que o trabalho popular é uma arte
de lidar com gente, não uma ciência, que se aprende com a prática. Como vícios
próprios da massificação elege para elucidação: despersonalizar e
descaracterizar a demanda popular, em nome do aparelhismo do partido, da igreja
ou da classe (...)" [4]
Desta forma, promove-se
a troca de conhecimentos, sem imposições, permitindo que a comunidade exponha
suas demandas e seja possibilitada a solucioná-las.
Deve-se ter claro que o
militante deve estar imbuído no "respeito para com as populações imersas
nos processos sociais que se deseja estudar", o qual "se expressa
particularmente através da devolução do conhecimento aos setores-chave da
classe popular (...) devolver às massas com maior clareza e de forma
sistematizada o conhecimento que delas recolheu difusamente”.
Conclui-se, portanto,
que há grande semelhança na forma de atuar dos núcleos de Assessoria Jurídica
Popular e dos grupos que utilizam as técnicas do Teatro do Oprimido, uma vez
ambos buscam a emancipação do ser, sem que haja nas relações desenvolvidas a
promoção de um sujeito que detém o conhecimento e o passa numa relação
unilateral, mas busca a promoção da igualdade material dentro da relação,
através da construção conjunta.
[1] SANTOS, Bárbara.
Teatro do Oprimido. Centro do Teatro Oprimido.
[2] MOURA, Aliyne Dayse
Macedo de. Direito e Arte: A utilização do Teatro do Oprimido por parte das
Assessorias Jurídicas Universitárias Populares. 2012, p. 16.
[3] CRUZ, Joana. O que é
o teatro do oprimido?
[4] RIBAS, Luís Otávio.
Direito insurgente e pluralismo jurídico: assessoria jurídica de movimentos
populares em Porto Alegre e no Rio de Janeiro (1960-2000). Florianópolis, 2009.
P. 71.
[5] BONILLA, Victor D;
CASTILLO, Gonzalo; BORDA, Orlando Fals; LIBREROS, Augusto. Causa popular,
ciência popular. Uma metodologia do conhecimento científico através da ação.
In: BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Repensando a pesquisa militante. São Paulo:
Brasiliense, 1999. P. 130-157.
Referências
Bibliográficas:
BONILLA, Victor D;
CASTILLO, Gonzalo; BORDA, Orlando Fals; LIBREROS, Augusto. Causa popular,
ciência popular. Uma metodologia do conhecimento científico através da ação.
In: BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Repensando a pesquisa militante. São Paulo:
Brasiliense, 1999.
CRUZ, Joana. O que é o
teatro do oprimido? Disponível online <http://oprima.wordpress.com/o-que-e-o-oprimaiabout/›.
MOURA, Allyne Dayse
Macedo de. Direito e Arte: A utilização do Teatro do Oprimido por parte das
Assessorias Jurídicas Universitárias Populares. 2012. Disponível online
<http://www.idb-fdul.com/uploadecl/files/2012_07_4181_4207.pdf›.
RIBAS, Luís Otávio.
Direito insurgente e pluralismo jurídico: assessoria jurídica de movimentos
populares em Porto Alegre e no Rio de Janeiro (1960-2000). Florianópolis, 2009.
SANTOS, Bárbara. Teatro
do Oprimido. Centro do Teatro Oprimido. Disponível online:
<http://ctorio.org.brinovosite/arvore-do-to/teatro-do-oprimido/›.
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