quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Formação em direitos humanos com movimentos sociais: limites e possibilidades

Por ser professor de direitos humanos, vira e mexe me deparo com perguntas ou convite para ministrar oficinas com movimentos sociais sobre direitos humanos e me pergunto o que dizer sobre os direitos humanos e a estrutura teórica e institucional montada em torno desse "tão amplo" campo de discussão.
Gosto sempre de partir do pessimismo para depois, e só depois mesmo, chegar no otimismo. Não acreditar que os direitos humanos seja uma panacéia ou "a" resposta as lutas sociais é algo importante para delimitar, num segundo momento, que eles são instrumentos jurídicos que devem ser disputados política e ideológicamente, com a necessária formação de estratégias de reivindicação de direitos que passe, também, pela disputa política e ideológica das próprias instituições que oficialmente os protegem ou materializam em políticas sociais, em particular as múltiplas facetas do Estado, e sobretudo do Poder Judiciário, cujos interesses de classe tornam-o, por vezes, o principal inimigo dos movimentos sociais, no avanço da criminalização dos movimentos sociais e da baixa resolução de conflitos que tem como parte pleiteante esses sujeitos coletivos de direito - e, com isso, direitos coletivos que ainda esbarram numa lógica processual e de formação jurídica que impede/minimiza sua realização pelas vias judiciais.
E o que mais? Será que os direitos humanos podem ser instrumento de combate as desigualdades e discriminações? Sem dúvida que sim, daí a faceta otimista. Não por acaso, a maioria das coletividades socioculturalmente vulnerabilizadas protagonizaram, ao longo do século XX, e com maior intensidade nos últimos 30 anos, lutas sociais em prol de seu reconhecimento identitário e organizacional casado ao reconhecimento de direitos coletivos e individuais específicos, haja vista, por exemplo, os indígenas, os homossexuais e as mulheres.
Mas isso não quer dizer que tenham passado do reconhecimento formal de direitos para o reconhecimento material, nem tão pouco que os direitos formais tenham se constituídos da forma como reivindicavam, pois aqui o jogo cotidiano do poder sócio-estatal exerce imensa influencia. Daí porque é quase sempre necessário discutir (1) que a mobilização política é pressuposto fundacional da mobilização jurídica, é dizer, que as lutas sociais pela realização de direitos são cotidianas; (2) que o tempo e a dimensão da efetividade de direitos nunca serão satisfatórios, pois imersos em jogos/conflitos de poder nos quais os interesses populares são, quase sempre, contra-hegemônicos ao status quo do poder; e, (3) que há direitos ainda não positivados e que nem sempre precisarão tramitar por esse rumo, mas sendo necessário entender que lutar pelos "nossos"direitos humanos - no sentido dos direitos dos grupos sociais que se objetivam em movimentos sociais - muitas vezes significa atuar na (suposta) ilegalidade, para mudar realidades e as próprias leis; (4) decorre do último ponto a compreensão de que nem sempre é possível fazer justiça por meio do direito estatal, daí que o campo do pluralismo jurídico é condição necessária para a sustentação de lutas sociais e da vida em sociedades multiculturais , não apenas para contestar o direito estatal.
São pontos de reflexão em aberto...

3 comentários:

  1. Lindo, Assis!

    Entendo os direitos humanos como uma categoria ambivalente que por isso deve sempre estar sendo "vigiada" ( criticada, construída, desconstruída, reconstruída) porque no jogo semântico, jurídico, retórico e prático desses direitos, as aparas, as arestas que sobram, ou que não damos atenção são "simplesmente" seres humanos que já estavam em situação de vulnerabilidade. Por isso a necessidade de reiteração desta temática, que tem tido muito espaço aqui no blogue.

    Espero que sempre procuremos mostrar as facetas destes direitos humanos: as óbvias, os subterfúgios, as incongruências, os ganhos e as perdas.

    Por isso, Assis, sua exortação à reflexão, assim como as anteriores que aqui foram feitas no blogue são tão prementes.

    Grande abraço!

    PS. Vale indicar a (re)leitura de algumas postagens anteriores sobre direitos humanos:
    http://assessoriajuridicapopular.blogspot.com/2010/11/critica-aos-direitos-humanos-e.html

    http://assessoriajuridicapopular.blogspot.com/2010/10/critica-aos-direitos-humanos-e.html

    http://assessoriajuridicapopular.blogspot.com/2010/03/programa-nacional-de-direitos-humanos.html

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  2. Olá Assis
    Que bom perceber esta interlocução, percebo que o objetivo deste meio de comunicação coletivo está cumprindo seu papel!
    Achei interessante você definir como momentos pessimista e otimista...
    O pluralismo jurídica precisa mesmo voltar para os nossos debates.

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  3. Nayara e Ribas,
    Depois que fiz o texto é que fui ver da postagem do Ribas sobre Movimentos Sociais e DH's, aliás, cuja discussão gerada foi riquíssima!
    Acho que o caminho são dos dois fatos centrais que vocês ressaltam, ter consciência dessa ambivalência dos direitos humanos e saber discuti-los a partir do pluralismo jurídico.
    Abraços.

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