É bastante interessante obervar, atualmente, um reascenso do debate marxista dentro das fronteiras que a modernidade capitalista chamou de direito. Disseminam-se os textos de Marx bem como o de seus continuadores, difundem-se estudos interpretativos sobre o tema, os estudantes se interessam cada vez mais pelo problema e os movimentos sociais e populares reivindicam alguma aproximação com a crítica marxista ao direito.
Isto nos deve fazer pensar em qual o porquê desse reaparecimento. Na verdade, a primeira resposta deve ser a de que nunca houve um esgotamento total do debate. Por isso, não se trata exatamente de um reaparecimento, mas de uma nova visibilidade, fruto, sem dúvida alguma, do amadurecimento adquirido nesta seara que hoje se apresenta como uma significativa linha de pesquisa própria: "direito e marxismo" (bem na linha de outras investigações jurídicas - que, como esta, não se comprazem com as problemáticas clássicas do mundo do direito em sua versão hegemônica - também caracterizadas por uma definição "sindética", ou seja, o uso do síndeto, a palavra "e", como em "direito e literatura", "direito e psicanálise", "direito e economia", "direito e religião" ou "direito e informática", dentre outros).
No entanto, mais do que perceber esta relação dentro dos quadrados termos impostos pela institucionalidade acadêmica, parece ainda mais interessante verificar que se trata de um debate radicalizado dentro das discussões clássicas em torno das teorias críticas do direito. Isto, porém, não leva necessariamente a uma realização plena da perspectiva marxista acerca do direito, já que pode se sectarizar e deixar de responder a anseios concretos da realidade jurídico-política presente.
Senão vejamos. No caso brasileiro, a crítica jurídica passou a ganhar espaço durante a década de 1970, quando passaram a se consolidar os cursos de pós-graduação em direito no país. Esta concretização vem acompanhada do maremoto diaspórico que abalou a intelectualidade brasileira, em especial a chamada esquerda. Não se trata, portanto, pura e simplesmente de se imputar aos exílios de tantos e tantos intelectuais contestadores a razão de ser da cristalização da crítica jurídica entre nós, mas sim de perceber que, nos fluxos e refluxos operados pelos regimes de força aqui vividos, tornou-se possível o diálogo com as tendências teóricas internacionais (notadamente, as européias) e um movimento de resistência teórica interna, ao mesmo tempo. Assim é que a crítica jurídica nacional se forma: lendo os professores franceses, os magistrados italianos e os juízes espanhóis. Mas isto é só um lado da história.
Do outro, há a sublevação teórico-prática de vários trabalhadores do direito em defesa daqueles que acabaram sendo atingidos pelo modo de produção capitalista dependente. E isto acaba sendo um retrato para toda a América Latina. E para se viver este atingimento não foi preciso um regime militar nem as suas atrocidades em termos de cessação de vigência de liberdades e garantias individuais fundamentais. A violência social sempre esteve presente - e ainda está, incrivelmente! - e as grandes maiorias da população permaneceram subjugadas por esses grilhões. Lembro-me, aqui, do auge do movimento anarquista ou das Ligas Camponesas, ambos acontecimentos que se prolongaram no tempo e que não sofreram com a repressão político-jurídica de uma ditadura tal como nós costumamos a pensá-la.
Há toda uma história ainda por se construir acerca da resistência popular e sua relação com o direito. No âmbito do período colonial, a história do direito precisa avançar muito e deixar de fazer apenas a história dos colonizadores, porque o retrato dos condenados da terra continua terrivelmente apagado e sequer sucede ao retrato dos invaores da terra. Mas isto só se tornará uma realidade teórica a partir do momento em que se consiga estabelecer uma ampliação de perspectiva acerca do que se entenda pelo fenômeno jurídico. Enquanto direito for o direito oficial, pouco nos caberá fazer. E mais: pouco também avançaremos se apenas focarmos a resistência na arena do direito formal. Sim, processos judiciais e procedimentos administrativos (para usar expressões de hoje) permitem ver muitas coisas - e já por aí se percebe a tarefa tapuia que nos desafia a todos - mas é preciso ver o "direito" para além de suas fronteiras técnicas e estatais. É preciso, pois bem, alargar sua conceituação, percebendo-o como uma forma histórica e complexa de compreensão da organização política de uma sociedade, de um povo, de uma cultura.
Daí fazer sentido prático a contribuição do debate marxista sobre o direito e, em especial, sobre a crítica jurídica. No tangente a isto, é preciso que continuemos reivindicando, em primeiro lugar, uma teoria crítica do direito. Mas uma teoria crítica que exsurja dos escombros de quatro décadas de ruínas do direito crítico. Isto porque a marca deste edifício corroído e em permanente crise tem sido o déficit da práxis: ou os críticos se perdem na curva da teoria ou morrem na estrada da praxe. É uma afirmação dura e presunçosa. Mas é algo que precisa ser dito.
Em segundo lugar, faz-se premente perceber a historicidade do fenômeno jurídico e sua não universalidade. Trata-se do encontro histórico entre Marx e o direito. Ou melhor, entre Marx e o não-direito. Em toda sua obra, podemos inferir reflexões e ponderações acerca do jurídico. Mas, acima de tudo, é preciso cotejar estas aproximações com sua proposta de uma ciência total, a história. Não se trata de canonizar Marx nem biblificar seus escritos, mas sim de compreender sua arguta interpretação do mundo e sua radical proposta de transformação da realidade. Bastante grosso modo, a realidade vigente é a do capital que explora o trabalho; deve-se passar, então, a superar esta contradição, a partir da força motriz da realidade - o pólo explorado, dentro desta contradição. Assim é que o direito como fenômeno deve se diferenciar do direito como categoria, a partir de Marx. Ainda que incipiente e frágil, esta distinção pode ser válida na medida em que todo trabalhador progressista do direito permanece renitente em disputar o conceito de direito, reivindicando o lado "bom" de sua prática, quase que como um edipianismo fetichista: a profissão como mãe, desejada e idolatrada, mesmo que fadada à interdição e ao sepulcro. Quando se apercebem disto, os trabalhadores progressistas do direito costumamos furar nossos próprios olhos... E os conceitos de direitos humanos e cidadania, por exemplo, estão aí para comprovar a automutilação.
À parte mitologemas helenocêntricos, eis um desafio. Certamente, um desafio algo mais que nominalista. Reivindicar a universalidade do direito-fenômeno é, realmente, não se dar conta de que tal fenômeno só existe enquanto existe o modo de producação capitalista, a modernidade, o ocidente colonial ou qualquer outra denominação que se queira dar ao tempo histórico dos últimos quinhentos anos. Agora, se chamarmos de direito toda organização política de uma cultura, estaremos resolvendo o problema, mas perdendo de vista a especificidade de nossa história presente. Daí ganhar sentido, um sentido revigorado, a tese da abolição do direito e do estado. Mas se trata de uma extinção palpável, porque fruto de uma transição para uma nova forma de organizar a humanidade, uma autoconsciente organização, um novo mundo e cosmogonia, que pelo simples fato de ser imaginado e tentado e ainda não desabonado continua possível. É utopia, ainda que não utopismo.
Dito isto, falta ainda fazer menção à terceira atitude reivindicativa da teoria crítica marxista do (não-)direito: a coerência, a práxis. Sem dúvida, a mais difícil das necessidades do crítico do direito. Entre a realidade e a utopia, deve ficar com as mediações da luta. Sim, ler "A questão judaica", "O capital" ou a "Crítica ao programa de Gotha"; mas também encontrar seu quinhão no mundo da prática, seu serviço como intelectual - já que todos são intelectuais - em favor dos novos sujeitos históricos da transformação, uma transformação qualificada, revolucionária. Advogados, promotores, juízes, delegados e professores, todos devem ter este horizonte. Mas esse horizonte só se pode construir na luta quotidiana e na organização política (gosto de chamá-la de construção poder dual/plural), mesmo que com as maiores dificuldades impingidas à organização. Por isso mesmo, juristas não são apenas os profissionais da divisão do trabalho social, pois, se o direito é organização política, todos somos juristas-políticos.
A partir disso é que se pode dar espaço à marxologia. Nunca antes disto. A definição triádica de direito em Estuca ou o antinormativismo de Pachucânis, assim como a crítica estrutural de Miaile ou o alternativismo latino-americano, todas estas visões precisam ser colocadas sob o crivo da história e a história não é um dado, mas antes é construída. Urge relermos, casando-os, a obra de Lira Filho assim como os feitos de Presbúrguer. Neles, não se cindem teoria e prática, mas há de se os superar, porque só na práxis histórica se encontra a verdade. E nós a reivindicamos, e como (tal e qual os "Obreros", da pintura acima de Ricardo Carpani)!
Vida longa a coluna Prestes!
ResponderExcluirQue o exemplo foquista não sirva de amarra ao parente curitibano do gaúcho guevarista, e que se faça intelectual da libertação das massas.
Gostaria de retomar tua idéia de "furar os olhos", para melhor compreender-la.
A tarefa de ler Marx está no exemplo de Paulo Freire, é preciso ler o mundo, e escrever nossa palavra neste.
Não vejo outra forma de realizar esta leitura senão nas experiências de resistência e insurgência de trabalhadores, na América Latina, África e todos os rincões de nosso mundo.
Acredito, como você, que a chave está no poder dual/plural. Aquele que está inscrito e conscrito no atual, mas que é anúncio do novo. Fico com dois exemplos interessantíssimos, do Contestado (que já vimos por aqui - http://assessoriajuridicapopular.blogspot.com/2010/05/poder-politico-juridico-dualplural.html) e do quilombo dos palmares (pelo seu caráter descolonial e comunal, merece a nossa atenção por aqui).
Façamos a releitura de Marx a partir do Brasil, suas experiências políticas de luta e contestação do poder autoritário e opressivo.
Façamos hoje!
Quanto ao direito, a experiência do MST sinaliza claramente para um "marxismo" relido. Trata-se de extinguir este Estado, este Direito, para que insurja um novo. Para isto, é necessária negação do direito, mas também conferir um sentido positivo, presente na luta política da ação direta (a ocupação é o exemplo mais bem acabado). A ocupação é a manifestação do direito de resistência, mas também fura a barreira do Estado e faz sangrar um novo direito, presente na forma de produção da vida dos assentamentos.
Abraço
Um comentário que cabe tanto à coluna Prestes-Pazello como ao texto do Luiz (sem querer furar olhos de nada nem ninguém):
ResponderExcluira negação do Direito não pode ser metafísica, pois aí cai-se num absolutismo que nega o jurídico "em si" como pura e simples opressão; é sempre uma negação dialética (negação da negação, como lembrava Lyra Filho), ou analética (porque seu ponto de partida é o compromisso com o Outro, como pobre, explorado, oprimido, excluído etc).
Se a negação do Direito burguês é um "Direito proletário", dentre deste pólo dialético há uma contradição que gera a negação da negação, a negação do "Direito proletário" e do Direito em geral. Esse processo é intrinsecamente ligado às transformações societais que a negação do Direito burguês (só possível com a negação de toda a sociedade burguesa) enseja, inclusive nas relações de poder existentes.
Lembrem que Fidel fundou seu programa revolucionário no Direito constitucional violado pelo golpe de Batista, e que o MST tem as ocupações como um dos instrumentos de luta, junto com outros que usam e abusam da ordem jurídica vigente, por mais limitada que seja.
Diego,
ResponderExcluirConcordo com várias considerações de conteúdo de seus comentários tanto ao meu texto sobre marxismo e direito quanto ao texto do Luiz sobre a relação entre direito e ditadura. Só não consigo concordar com essa visão universalista do direito que pode ser usado tanto pelo bem quanto para o mau. Um instrumento e, como tal, objeto cultural da e toda civilização.
Foi por isso que propus uma distinção, ainda que frágil, entre direito-fenômeno e direito-categoria, a partir de Marx. O direito-fenômeno é aquilo que Pachucânis chamou de, pura e simplesmente, "direito". Fê-lo, dentre outros motivos, para contrapôr-se a Estuca, por exemplo, para quem era necessário um direito proletário que se definia por ser instrumento da classe dominante, portanto, do poder soviético. O interessante é que nem um nem outro apregoavam a sobrevivência do direito no comunismo avançado, porque se o seu conceito se liga ao de classe dominante logo o seu desaparecimento implica a abolição do próprio "direito".
Por outro lado, falei em direito-categoria, querendo ressaltar a questão de uma organização política intrínseca a toda realidade social humana. Sé nesse quadrante faz sentido o brocardo: onde há sociedade, aí está o direito (direito-categoria, organização política). Não se trata, a meu entender, de uma negação metafísica do direito. Muito ao contrário. Trata-se de uma prévia ideação (momento próprio do materialismo histórico e crítico) de algo ainda não realizado. Não se deve, por isso, fazer uma crítica metafísica ao plano da abstração. A abstração é operação fundamental no pensamento marxista. Em especial, quanto ao método.
Daí fazer sentido encontrar a especificidade do direito-fenômeno como sendo a forma jurídica que permite e impõe as relações sociais capitalistas. Neste sentido, os contratos e, notadamente, o direito de propriedade ganham visibilidade.
A negação da negação, apesar de todo crédito que devemos à construção teórica liriana, não deixa de ser operação lógico-formal, por isso eu me coadunar com a proposta de método do venezuelano Ludovico Silva no sentido da desnaturalização da dialética. A realidade não é dialética, porque ao sê-la negar-se-ia a si mesma e afirmaria a indução ou a dedução. E negar a realidade é, aí sim, metafísica, porta pós-moderna nas interpretações, as mais ortodoxas, da obra de Marx. É preciso superar o hegelianismo da interpretação marxiana assim como o adesismo revolucionário: há teoria crítica porque a tradicional é insuficiente. E isto vale para qualquer experiência histórica, seja a das revoluções latino-americanas como a cubana, a chilena ou a nicaragüense, seja a dos movimentos populares de novo tipo, como os surgidos a partir da década de 1970.
Enfim, negar o direito-fenômeno, para mim, não é afirmá-lo. Isto seria un subterfúgio para conservar as coisas tais como aí estão. A forma jurídica e o logicismo dialeticista são cúmplices.
"A realidade não é dialética, porque ao sê-la negar-se-ia a si mesma e afirmaria a indução ou a dedução. E negar a realidade é, aí sim, metafísica, porta pós-moderna nas interpretações, as mais ortodoxas, da obra de Marx. É preciso superar o hegelianismo da interpretação marxiana assim como o adesismo revolucionário".
ResponderExcluirO nome disso? Taoísmo.
Nasce Taozello, o novo monge antidialético.
"Se a negação do Direito burguês é um "Direito proletário", dentre deste pólo dialético há uma contradição que gera a negação da negação, a negação do "Direito proletário" e do Direito em geral. Esse processo é intrinsecamente ligado às transformações societais que a negação do Direito burguês (só possível com a negação de toda a sociedade burguesa) enseja, inclusive nas relações de poder existentes".
ResponderExcluirA negação do Direito não acarreta apenas a negação do Direito em si, mas, em um só movimento, a superação de todas as estruturas de organização social ora vigentes, vez que o direito é um apêndice delas. É um pensamento estático a dialética que opõe as menores conseqüências sem opor as maiores causas, os monolitos hegemônicos que constituem o "Estado", a "Totalidade". E, quando essa oposição elementar se der, supondo que tenha a dialética um futuro glorioso sem mais interrupções, demonstrar-se-á a engrenagem empenada de todo falso movimento, vez que a superação que propõe exige novas e infinitas oposições, mesmo onde elas não existem.
Grande texto!
ResponderExcluirApós o elogio diminuto, mas verdadeiro, vamos a discussão.
Grande parte do texto não é novidade para mim, pois discutimos inumeras vezes o assunto. A novidade é a que mais me desagrada. Essa distinção direito-fenomeno e direito-cateogoria, já sublinhada como insuficente, de fato, em nada é esclarecedora.
Na verdade, achei a distinção inconsistente. Mas como não esmiuças teoricamente as implicações do que quiseste dizer, trata-se, talvez, de imcompreensão da minha parte.
Penso ser o grande problema o emprego do termo categoria da forma que foi utilizado. Nao há dúvida que conheces a Introdução de 1857 (até porque tenho cópia de tua edição sublinhada na passagem), lá Marx compreende as categorias como formas de ser e determinações de existência. Uma vez assim entendido, como podes operar tal ahistorização das categorizações? O direito-fenomeno teria que, necessariamente, ser representado por categorias para ser apreendido idealmente. Não é o seu desejo, tenho certeza, porém estás relegando concretude ao termo direito-categoria - pareces elevá-lo a um metaconceito.
No mais, temos um ressurgimento intelectual e monográfico do debate. O que é em si muito importante e digno de comemoração. Vejo isso muito mais como um esforço de criar uma escola academica do que um movimento dentro do direito.
Abração
Moisés
O que dizer, Moisés?
ResponderExcluirVocê tem toda razão. Não usei a expressão "categoria" tal qual ela é concebida tradicionalmente dentro do debate marxista. Um equívoco, por eu estar pretendendo levar a cabo uma interpretação marxista. Fiz um uso talvez inapropriado, querendo expressar o seguinte: por conta do debate feito no seio da assessoria jurídica popular e da teoria crítica do direito costumar reivindicar a noção de direito para falar em "justiça" ou "liberdade/igualdade" ou ainda em "respeito à sociabilidade" (não anarquia), entendi por bem dialogar com este entendimento e crivar a idéia de "direito" como que sendo uma "factibilitas", ou seja, a maneira abstrata (essencial para a compreensão do método materialista histórico) de dizer um ser concreto. Se o conceito de "categoria" significa forma de dizer o ser concreto e histórico das coisas ou, nas palavras de Marx, "formas de ser, determinações da existência", a categoria categoria não é usada nesse sentido, ao menos à primeira vista. Quero dizer, trata-se de um arifício da linguagem para dizer o abstrato que por isso mesmo é difícil de ser dito (refiro-me à primeira "categoria" da expressão "a categoria categoria não é..."). Assim, a linguagem concreta é histórica, mas o fato de se usar da linguagem para a intersubjetividade não o é; o mesmo vale para as categorias econômicas: "mercadoria", "dinheiro" ou "capital" são categorias (a segunda da expressão acima); mas quando se diz a "categoria mercadoria" etc. só a idéia de "mercadoria" ganha tal concretude (já que "categoria" se apresenta como a primeira síntese). Caso contrário, qual a categoria não-categoria possível de ser utilizada em contextos pretéritos ao do modo de produção capitalista? Quer dizer: não existe uma categoria "física" ou "Deus" nos pensamentos aristotélico ou medieval. É a este conjunto de idéias que me referia.
Enfim, mas creio mesmo na instabilidade da distinção, nem tanto por sua nomenclatura, mas mais pelo que quer expressar mesmo. Talvez, seja o caso de resolvê-lo por ora lançando-se mão do artifício nominalista: "direito-categorização" ao invés de "...-categoria", já que a segunda expressaria o ser concreto e histórico das coisas, ao passo que a primeira o antecedente operacional (mediação do método da totalidade) da linguagem que expressa o ser concreto das coisas. De qualquer forma, Moisés, valeu pela consideração e pela oportunidade da discussão que permanecerá (tomara que no sentido de superação desta falsa, a seu ver, categorização que se apresenta como categoria historicamente necessária, a meu ver).
Por fim, ao André, aponto: impossível isso tudo ser taoísmo justamente porque a noção de totalidade resta intocável, ainda que nunca como um monolito.
Explicou o que não disse, estragou o que disse e de taoísmo em potência retornou à filosofia da miséria e da demência.
ResponderExcluirAinda assim me parece complicado. O Lukács (Ontologia do Ser Social, ao desenvolver os traços metodologicos de Marx, considera as categorias citadas - mercadoria, dinheiro, capital - como um caminho ao concreto. Categorias abstratas, é verdade, nem por isso menos reais. Da mesma forma, categorias como Deus, pode não existir como ser-precisamente-assim - se baseia em uma ontologia falsa -, mas opera na realidade e mobiliza atos teleologicos como se assim fosse. Quero dizer, trata-se de uma categoria abstrata - talvez falsa -, mas representa relações concretas da sociedade. Eu não acho que a intenção seja conscientemente produzir uma mistificação idealista. Se o objetivo é delinear o direito como toda forma de regulação e controle social (alienado ou não), talvez o mais interessante consista em adjetivá-lo depois - direito indigena, direito burgues, etc.. Perde-se a especificidade da representação do que é o Direito, mas ainda se apresenta como mais solida que a distinção sugerida.
ResponderExcluirA questão, para mim, não passa por mero nominalismo. Ela tem repercussões serissimas na práxis política. Essa crença em um outro direito, por vezes redunda em uma fetichização formalista do direito. Isto é, a questão principal é o conteúdo e interesse de classe ali contidos - a velha e importante discussão soviética. Negligencia-se que a forma jurídica é imanente ao modo de produzir e reproduzir o capital. No sentido oposto, caimos em uma proposta quase jusnaturalista de um Lyra Filho.
Por último, não tenho o conheço (Lao), mas só podes ser um brincalhão. Evidentemente, como podes ter notado, não concordo com a negação da dialética hegeliana tal como foi apresentada pelo Pazello. Mas taoísmo é sacanagem. Haha
Abração
Moisés
Grande Moisés,
ResponderExcluirAcho que o problema central é justamente trabalhar com o resgate ou não da noção de direito. A princípio, gosto da proposta pachucaniana: abolição. No entanto, sem a expressão "direito" perdemos a chance de visualizar o que seja uma nova organização política e social. Caímos - ao menos, para os que se recusam a aceitar a interpretação marxista (e estes não são poucos!) - num abstracionismo e é preciso dar conta dessa comunicabilidade.
De todo modo, o alerta mais importante de sua intervenção, que considero absorvido em meu comentário, é o de que um suposto direito-categorização não pode redundar em uma fetichização formalista do direito. Disso fujo, sem dúvida.
Direito proletário, direito-categorização... ainda há de surgir uma outra forma de concretização dessa idéia futura.
Aliás, Moisés, como você avalia a presença do problema "jurídico" no imaginário proletário, o que pode ser visto a partir das várias traduções da canção "A internacional", conforme a minha última postagem? (gostaria de saber sua opinião sobre isso e, claro, puxar a sardinha para este texto não comentado, hehe).
Abraços e valeu!
"Taozello" é uma esperança, mas foi mais uma ironia.
ResponderExcluir"Taoísmo é sacanagem" é algo que não precisamos discutir antes de o colega informar:
1. seus pontos de discordância com a filosofia taoísta;
2. especificamente o que ela deixa a desejar em relação ao monopólio do "polemos" dialético no pensamento eurocêntrico mimetizado no além-mar.
A partir daí, poderemos inclusive enveredar pelas suas aplicações práticas, incluindo a sacanagem.