A coluna AJP na Universidade traz,
hoje, a reflexão sobre os direitos dos geraizeiros (comunidade tradicional
própria do cerrado). No entanto, o texto enfatiza muito o contexto de lutas e
organização do movimento geraizeiro, o que vem bastante a calhar com a data de hoje,
por ser relembrada com ela os 80 anos da criação oficial da ALN – Aliança Nacional
Libertadora, a 12 de março de 1935, para unificar as forças democráticas e
progressistas do Brasil contra o fascismo. O advogado popular mineiro Aldinei
Sebastião Dias Leão entra em campo para debater o direito dos geraizeiros a seu
território no contexto do cenário jurídico brasileiro, que reconhece os povos e
comunidades tradicionais, mas não tem se mostrado efetivo para com suas
demandas mais concretas. O ensaio é resultado discussões realizadas pela turma
de “Teorias Críticas do Direito e Assessoria Jurídica Popular”, da
Especialização em Direitos Sociais do Campo da UFG, na Cidade de Goiás. Boa
leitura!
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O direito do campo no campo do direito
O processo de
retomada dos territórios geraizeiros: estratégias, parcerias e entraves na
busca pela efetivação e construção de (novos) direitos
Aldinei Sebastião Dias Leão
Advogado popular em Minas Gerais
estudante da Turma de Especialização em
Direitos Sociais do Campo - Residência Agrária (UFG)
Atualmente, há um número crescente de
conflitos socioambientais na microrregião do Alto Rio Pardo – extremo norte de
Minas Gerais – causados pela reação das comunidades face à expropriação de suas
chapadas. Isso se deu, sobretudo, com a notícia dos vencimentos dos contratos
de arrendamento outrora (década de 1970) celebrados entre o Estado e Empresas,
para uso daquelas terras para plantio de eucalipto.
Na
medida em que as comunidades geraizeiras vão se organizando, sua luta vai
ganhando visibilidade, o que leva à aquisição de diversos apoios. E por meio
desses apoiadores, elas vão tomando conhecimento dos seus direitos e descobrindo
diversas irregularidades. Surgem manifestações, ocupações, denúncias e demandas
judiciais – ações de reintegração/manutenção de posse, ações populares e ações
civis públicas.
À
união dessas comunidades, que lutam pela proteção e/ou retomada de seus
territórios na microrregião do Alto Rio Pardo, tem-se denominado “Movimento geraizeiro”. Trata-se de um processo de
afirmação e construção de direitos, e de (re)afirmação da cultura e identidade
geraizeira, como população tradicional do Cerrado, face à violência sofrida
pela ação desrespeitosa, tanto do Estado, quanto das empresas e, mais
recentemente, pelas cooperativas de agropecuária e silvicultura.
É
preciso dizer que embora tenham emergido ao mundo jurídico por meio das lutas
populares algumas inovações legais – a exemplo do decreto presidencial
6.040/2007, ou mesmo da Convenção 169/OIT, da qual o Brasil é signatário – os
povos tradicionais ainda enfrentam várias dificuldades no ordenamento jurídico
pátrio, sobretudo no que concerne ao reconhecimento dos seus territórios.
Na
falta de uma resposta satisfatória no ordenamento jurídico, as diversas
comunidades se socorrem de várias maneiras, na busca pela retomada de seus
territórios. Na comunidade de Vereda Funda, por exemplo, a forma encontrada foi
a da criação de um Assentamento Extrativista, enquanto na Água Boa e outras
comunidades nos Municípios de Rio Pardo de Minas, Santo Antônio do Retiro e
Montezuma, busca-se a criação de uma RDS – Reserva de Desenvolvimento
Sustentável. A comunidade de Sobrado, por seu turno, juntamente com a rede
sociotécnica de apoio ao Movimento
geraizeiro, discute a criação de uma lei municipal de iniciativa popular que disporá sobre o reconhecimento das Comunidades
Tradicionais Geraizeiras e a proteção dos seus Territórios e seus modos de vida.
Outras comunidades, em diversos estágios de organização e luta, ainda buscam
achar outras respostas.
Neste
sentido, vale trazer à baila os ensinamentos do Roberto Lyra Filho que, na
tentativa de conceituar o Direito – que não se confunde com a lei –, diz que
aquele não é algo fixo, ou “uma resposta pronta e acabada”, mas, um “vir a
ser”. Segundo ele a vertente jurídica é incompreensível e inexplicável fora do
contexto das lutas de classes, o que ele denomina de “dialética social do
direito”. O Movimento geraizeiro é, portanto, uma
luta que perpassa pela efetivação de normas legais já existentes, ao passo que
busca também forçar o surgimento de novos direitos.
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Leia também:
Imbituba: crônica de um mandado de despejo, 3 jul. 2010
Os sujeitos históricos da transformação: organização político-jurídica e antropologia, por Ricardo Prestes Pazello
Campanha contra a "nova" criminalização dos saberes tradicionais, por Assis oliveira
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