Por anos, às portas da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, na esquina das Ruas Merlon de Morais com a Senador Pompeu, uma “casa” de papelão abrigou um homem.
A indiferença, apesar do tempo de compartilhamento do espaço, impediu que se conhecesse seu nome, de onde vinha, por que estava ali, ou mesmo, na falta de ações elementares como as anteriores, que se promovesse qualquer intervenção transformadora na vida dessa pessoa com que se convivia sem vê-la.
Por isso, também o homem da casa de papelão morreu sem ser percebido. Somente depois de algum tempo os integrantes da comunidade acadêmica da escola de direito da UFC notaram a falta de sua “casa” na esquina.
Ironicamente, uma faculdade de direito pôde conviver longamente com a falta de direitos sem se sentir responsável por isso. Mas, não são poucas as faculdades de direito que, negando-se a repensar as bases em que estruturam a educação que são capazes de prestar, eximem-se da responsabilidade de interferir nos problemas sociais e de formar pessoas capazes de realizar, promover e defender direitos humanos.
Sob o signo da neutralidade e da arrogância teórica, sustenta-se certa forma de educar, através de que se reforça e se propaga o direito da indiferença. Mas também, erguem-se muros, nem sempre visíveis, embora reais, que separam estudantes, professores e professoras da realidade, mesmo que esta esteja inegavelmente muito próxima.
Pensar o direito como legítima organização social da liberdade, à Lyra Filho, exige decerto uma virada epistemológica que não coaduna com a compreensão estabelecida no modelo central de ensino jurídico que se propaga pelo Brasil. Impõe que sejam revistas concepções e que se avaliem as condições de elaboração do pensamento hegemônico para vencer o conjunto de crenças e métodos cognitivos que impedem de se instalar nos ambientes de formação jurídica uma compreensão de que o direito nasce no seio de uma sociedade conflituosa, não-harmônica, ou seja, nasce na rua, no calor das lutas e das reivindicações sociais, e se destina a uma eterna e dialética busca da justiça, cujo conteúdo se delineia também no universo cultural, político e histórico, sem um a priori pré-definido, construído e atualizado no tempo e no processo mesmo de sua busca/realização na dinâmica da sociedade. Portanto, não é fruto exclusivo do poder político do Estado, não se reduz à expressão normativo/legalista, não se basta no espaço institucional que é, a um só tempo, criatura e criador da própria lei. E, acima de tudo, não é neutro. Estabelece um compromisso inevitável com a emancipação humana; não admitindo sua dicotomia em relação aos direitos humanos, porque só existe autenticamente enquanto elemento de superação de todas as formas de opressão.
Ainda, no seio dessa virada epistemológica, em que o direito se mostra complexamente no campo da eticidade, colocando-se inseparavelmente como forma de pensamento, realização e difusão de uma perspectiva libertadora, não eurocêntrica e colonialista, de direitos humanos, deslegitima-se o discurso da desigualdade e do desrespeito como problemas individuais; passa a ser fundamental eliminar a indiferença e a omissão como comportamento face aos problemas sociais e, o compromisso com a transformação da realidade de injustiças e vulnerabilidade social à violação de direitos se transforma no centro do universo de estudantes, educadoras, educadores e outros profissionais de direito.
A indiferença, apesar do tempo de compartilhamento do espaço, impediu que se conhecesse seu nome, de onde vinha, por que estava ali, ou mesmo, na falta de ações elementares como as anteriores, que se promovesse qualquer intervenção transformadora na vida dessa pessoa com que se convivia sem vê-la.
Por isso, também o homem da casa de papelão morreu sem ser percebido. Somente depois de algum tempo os integrantes da comunidade acadêmica da escola de direito da UFC notaram a falta de sua “casa” na esquina.
Ironicamente, uma faculdade de direito pôde conviver longamente com a falta de direitos sem se sentir responsável por isso. Mas, não são poucas as faculdades de direito que, negando-se a repensar as bases em que estruturam a educação que são capazes de prestar, eximem-se da responsabilidade de interferir nos problemas sociais e de formar pessoas capazes de realizar, promover e defender direitos humanos.
Sob o signo da neutralidade e da arrogância teórica, sustenta-se certa forma de educar, através de que se reforça e se propaga o direito da indiferença. Mas também, erguem-se muros, nem sempre visíveis, embora reais, que separam estudantes, professores e professoras da realidade, mesmo que esta esteja inegavelmente muito próxima.
Pensar o direito como legítima organização social da liberdade, à Lyra Filho, exige decerto uma virada epistemológica que não coaduna com a compreensão estabelecida no modelo central de ensino jurídico que se propaga pelo Brasil. Impõe que sejam revistas concepções e que se avaliem as condições de elaboração do pensamento hegemônico para vencer o conjunto de crenças e métodos cognitivos que impedem de se instalar nos ambientes de formação jurídica uma compreensão de que o direito nasce no seio de uma sociedade conflituosa, não-harmônica, ou seja, nasce na rua, no calor das lutas e das reivindicações sociais, e se destina a uma eterna e dialética busca da justiça, cujo conteúdo se delineia também no universo cultural, político e histórico, sem um a priori pré-definido, construído e atualizado no tempo e no processo mesmo de sua busca/realização na dinâmica da sociedade. Portanto, não é fruto exclusivo do poder político do Estado, não se reduz à expressão normativo/legalista, não se basta no espaço institucional que é, a um só tempo, criatura e criador da própria lei. E, acima de tudo, não é neutro. Estabelece um compromisso inevitável com a emancipação humana; não admitindo sua dicotomia em relação aos direitos humanos, porque só existe autenticamente enquanto elemento de superação de todas as formas de opressão.
Ainda, no seio dessa virada epistemológica, em que o direito se mostra complexamente no campo da eticidade, colocando-se inseparavelmente como forma de pensamento, realização e difusão de uma perspectiva libertadora, não eurocêntrica e colonialista, de direitos humanos, deslegitima-se o discurso da desigualdade e do desrespeito como problemas individuais; passa a ser fundamental eliminar a indiferença e a omissão como comportamento face aos problemas sociais e, o compromisso com a transformação da realidade de injustiças e vulnerabilidade social à violação de direitos se transforma no centro do universo de estudantes, educadoras, educadores e outros profissionais de direito.
Olá, "O que eu não vi hoje"!
ResponderExcluirMuito relevante sua postagem. É sempre bom lembrar o que não está sendo feito no mundo do ensino jurídico- que deveria ser o mesmo que "o homem da casa de papelão" vivia.
Quando eu leio uma postagem como a sua, não consigo deixar de me colocar no lugar dos que são indiferentes. Eu sinto como se a "repreensão" fosse comigo e, bom, o sentimento de culpa é inevitável.
Porque o homem da casa de papelão está aí na esquina, sempre. Hoje é homem da casa de papelão, amanhã é a senhora idosa, desamparada na parada de ônibus do hospital público, depois a mulher com a criança doente no colo a pedir um pouco de leite... Essa enumeração não é genérica, é fática. E se não tomarmos o devido cuidado, estes seres humanos, passam por nós sem rosto, nem voz, representando apenas o gênero do Sofrimento Humano.
E, voltando os olhos para nossa própria área de formação, a educação jurídica tem grande responsabilidade no incentivo a essa sensibilização. Formar bacharéis "experts" apenas na lógica normativa não garante a inserção de um ser humano com valores, pensamento e voz crítica a partir do Direito. E, infelizmente, a formação de "técnicos da lei" ainda tem sido a consequência dominante do ensino que temos hoje.
Como vamos mudar isto, queridos professores blogueiros?
Bjão!