A coluna AJP na
Universidade de hoje traz o relato do militante do Movimento Camponês Popular (MCP) Jossier Boleão sobre uma nova ordem em que o direito tivesse outra função. Em momentos como de fortalecimento das lutas populares em nosso país, também cresce a necessidade de compreender este processo. O texto foi produzido originalmente para a disciplina de
“Teorias Críticas do Direito e Assessoria Jurídica Popular”, da Especialização
em Direitos Sociais do Campo da UFG, na Cidade de Goiás, ministrada por Ricardo
Prestes Pazello.
Para uma (nova) sociedade
insistente, um direito insurgente
Jossier Boleão
O direito tem sido sempre um assunto
temido entre os movimentos sociais e as classes trabalhadoras. Claro que há
motivos para isso. O direito tem se apresentado historicamente contra a classe
trabalhadora. E o resultado de relações de forças, com embates diretos e
indiretos ocasionados pelo sistema capitalista.
O sistema capitalista fez com que o
direito burguês assumisse uma ênfase como Direito apaziguador. Ao mesmo tempo
em que este sistema de acumulação se globaliza, também individualiza. Isso
ecoou no direito, fazendo com que as lutas de classes ressoassem, frente ao
direito, como individuais e pessoais.
Desta forma, a criminalização dos
movimentos sociais e das lutas populares ganharam força. Todas as lutas tem
sido entendidas num aspecto pessoal, e não coletivo. De fato, o pressuposto do
direito não é esse, suas ideias são para todos. Mas sua leitura e
aplicabilidade é para poucos. Trava-se na atualidade uma disputa política para
que haja comunicação e tradução deste direito da forma como o conhecemos.
O que deveria ser a igualdade
jurídica tem se tornado uma nefasta renda para mascarar a imposição burguesa e
sua ideologia de poder e dominação. Nesse viés, o direito tem se tornado um
obstáculo real à transformação social. Não pela sua desvinculação com a vida
social, econômica ou política. Mas justamente por estar diretamente vinculado a
serviços que marginalizam e excluem.
Contextualizado no capitalismo, e
atendendo à classe burguesa atual, esse ordenamento jurídico se tornou um
dispositivo de (i)legalidade e de normatização. O papel de aplicabilidade dos
conjuntos de normas e regras cabe ao Estado. Dessa maneira, dá-se,
aparentemente, um caráter de imparcialidade. Mas isso é só aparente!
No processo de luta ideológica e
política travada pelos movimentos sociais, pelas comunidades marginalizadas e
grupos que têm seus direitos negligenciados é preciso uma outra aplicabilidade
do direito. Na construção de um projeto de sociedade diferente da que temos
atualmente. Isto não sendo possível, é preciso que os grupos marginalizados
consigam relevantes avanços mesmo dentro da ordem capitalista.
Esse direito que questiona e que
emerge de uma grande parcela da sociedade - aqui denominada insistente -, vai
de encontro com a ordem imposta pelo grande capital, traz voz ao subalterno e possibilita
um direito alternativo. Torna-se um direito insurgente, como bandeira de
enfrentamento ao naturalismo mercadológico imposto pelo capitalismo – com sua forma
de fazer do direito também um bem a ser privatizado.
Somente por meio das práticas
alternativas e da resistência dos grupos populares de defensores dos direitos
será possível uma nova ordem para o direito. Será concreta a criação de formas plurais
de resolução do direito. Ou seja, a existência de uma justiça que não seja cega
para o que acontece na vida social e para as diferenças existentes.
***
Leia também:
Alienação, Antonio Alberto Machado, 29 set. 2011
Livro Justiça e direitos, Terra de Direitos, 19 set. 2011
Do direito a insurgência ao direito insurgente, Ricardo Pazello e José Augusto Guterres, 29 fev 2012
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