quinta-feira, 1 de abril de 2010

Manda pro pessoal no ERENAJU Teresina

Neste feriado acontece em Teresina o XII Encontro da Rede Nacional de Assessoria Jurídica Universitária.
Em novembro de 2009 eu e o Ricardo Pazello fomos convidados para um oferecer um minicurso sobre "Crítica do direito", já relatado por aqui.

Tivemos muitos debates intensos naquela ocasião, aproveito a proximidade do ERENAJU para pontuar alguns. Estou escrevendo um artigo maior que é uma reflexão sobre a Carta-programa da rede, em breve divulgo por aqui.

Uma questão fundamental é a contribuição de Marx para o direito. Como disse nosso companheiro lúdico Lucas, do Coraje, "achei que não valia a pena estudar Marx, mais-valia".

Gostaria de relembrar a proposta conjunta apresentada por nós, de que a RENAJU pense a estratégia a partir dos seguintes pontos:
Assessoria jurídica popular - resistência
Cooperativismo popular - trabalho
Movimentos populares e sociais - organização
Universidade e educação popular - formação

A assessoria jurídica popular constitui numa ferramenta de resistência contra as arbitrariedades do Estado e suas omissões em relação à violência com os movimentos sociais. Pensada e praticada de forma isolada dos outros pontos propostos esta perde força. É necessário que seja pensada conforme a estratégia de Miguel Pressburger com o direito insurgente: ao tempo que é resistência ao instituído, é instituinte do novo dentro do velho.
O cooperativismo popular representa uma alternativa de trabalho da classe-que-vive-do-trabalho. A superexploração do trabalho no capitalismo é uma barreira a ser transposta por nossa geração. Quando é que iniciaremos o debate da autogestão e autofinanciamento?
Os movimentos populares e sociais são sujeitos da transformação. Lembrando a diferença proposta pelo Pazello, de que os movimentos populares são espécies de movimentos sociais, com o diferencial de apresentarem uma proposta econômica factível e contraposta ao capitalismo.
A universidade e a educação popular compõem a comunicação de uma educação como prática para a libertação. Não basta pensarmos em projetos de extensão de educação popular na universidade tradicional. É preciso pensar radicalmente o projeto de Paulo Freire em relação a universidade popular, institutos de estudos da América Latina, alfabetização infantil, alfabetização de adultos e a educação popular.

Gostaria de desejar um excelente encontro a todas e todos!

Belchior já dizia em "velha roupa colorida":
"Mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo
Que uma nova mudança em breve vai acontecer
E o que há algum tempo era jovem novo
Hoje é antigo, e precisamos todos rejuvenescer"

6 comentários:

  1. Há poucos dias acompanhando o blog e, a cada visita uma surpresa. Iniciei um trabalho de pesquisa sobre Responsabilidade Social na Administração (Ética, Direitos do Consumidores e Funcionários e Meio Ambiente)e, encontrei nesse post conceitos importantíssimos para formação da minha opinião.

    "Karl Marx chama a atenção para o fato de que os capitalistas, uma vez pago o salário de mercado pelo uso da força de trabalho, podem lançar mão de duas estratégias para ampliar sua taxa de lucro: estender a duração da jornada de trabalho mantendo o salário constante - o que ele chama de mais-valia absoluta; ou ampliar a produtividade física do trabalho pela via da mecanização - o que ele chama de mais-valia relativa."

    Eis as questões:
    Estudamos para praticar o capitalismo?
    Ou nos organizamos contra a força deste?

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  2. Bela sistematização Ribas.
    Acho que ela nos ajuda a definir e a ler as estratégias políticas a serem tomadas, ou que já estão sendo tomadas no âmbito da RENAJU.
    Trata-se, novamente, ainda que não explicitamente, de discutir a identidade ajupiana/renajuana e os rumos de seus ativismos político-acadêmico.
    Só uma coisa, com relação ao item RESISTENCIA: por que reduzi-lo ao âmbito do Estado e do capitalismo? As múltiplas formas de violência não podem ser lidas apenas centralizando nestes dois focos de luta/tensão, pois seriam reduzidas nos efeitos ou tornadas invisíveis quanto a produção. Sobretudo, não podemos pensar o racismo, o colonialismo, a homofobia e o machismo, só para falar dos mais conhecidos, apenas buscando a superação do capitalismo e a melhoria do atendimento/direitos do/pelo Estado. Nestes âmbitos da violência, a questão mais difícil é que opressores e oprimidos não podem ser definidos por polaridades tão definidas, é dizer, requerem a percepção de que os oprimidos também produzem opressão e vice-versa.
    Alias, isto já está em Paulo Freire, quando fala do "hospedar o opressor", cuja idéia vai buscar em Franz Fanon.
    Ainda assim, penso que talvez sua centralização seja uma postura estratégica.
    Enfim, uma provocação para o debate.
    Assis

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  3. Ribas,

    Muito legal a lembrança do mini-curso. Os participantes aproveitaram bastante vocês!

    Concordo com o Assis: bela sistematização.
    E também em mais um ponto. Existem certas questões sensíveis e que devem ser criticadas que vão além do sistema capitalista, que concordo que são potencializados de forma cruel e velada por ele (já que estão diluídas naquele sistema e as vivemos em nosso dia-a-dia quase como autômatos, quando não nos impomos o contínuo exercício de questionar o supostamente evidente). Elas são anteriores ao sistema capitalista, até...

    Enfim, sei que esse ponto é um tanto sensível... Mas o debate é muito salutar.

    :)

    Ps.O pessoal vai adorar a foto desse brotinho à beira do "Encontro das Águas" (Rio Poti e Parnaíba- Teresina-PI).

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  4. Luiz, Assis, Naiara e todos,

    Gostaria de dizer que o texto do Luiz, em grande parte, traz à tona nossa reflexão quando da realização do minicurso "Crítica da crítica crítica: ou a sagrada famílai jurídica" junto aos estudantes da UESPI e UFPI, em Teresina. Infelizmente, não consegui comentar antes do ERENAJU, mas ainda assim vou tecer algumas considerações.

    Nós apontamos, como bem lembra a sistematização do Luiz, para quatro questões que devem guiar a crítica jurídica hoje, segundo nosso ver. Trabalho, resistência, formação e organização são pautas populares que não podem ser vistas fragmentariamente. No entanto, também precisamos reconhecer nosso local de atuação. Daí que a valorização da assessoria jurídica popular como espaço de resistência se afirma sobremaneira, na medida em que não podemos ter uma visão ingênua (ainda que também não fatalista) sobre o papel que o direito desempenha em nossa sociedade. Eu acredito que sua função seja ambígua e jamais pode se constituir na ponta-de-lança de um processo transformador. Deve estar contido neste último, mas de forma alguma ser maior que ele. Daí a necessidade de pensarmos a crítica jurídica como atuando nos espaços de resistência político-jurídicos estatais. Este é um ponto.

    Outro ponto pertine ao problema da crítica ao capitalismo (que é maior que a crítica à ambigüidade jurídica). Não posso deixar de concordar com os companheiros - como bem lembrou a Naiara - que há opressões anteriores ao capitalismo, mas isto não desnatura o fato de que este seja um modo de produção total, que abarca toda a produção da vida atual, de forma hegemônica (e percebam: o conceito de hegemonia pressupõe os desvãos da contra-hegemonia!). A rsistência da assessoria jurídica ao capitalismo é diversa da resistência ao capitalismo em geral. Nós assumimos uma posição, ao tempo do minicurso, de resgatar a contribuição de Marx e esta contribuição passa pela necessidade de visualizarmos alternativas a este modo de produção. Daí ser necessário discutir o problema da centralidade do trabalho, ainda que sem nunca descurar dois outros cortes opressivos de nossa sociedade: o do racismo e o do patriarcalismo.

    Assim, gostaria de ressaltar que o corte de classe continua vivo e é preciso que a crítica jurídica se dê conta disso. Ressaltar o corte racista e patriarcalista da sociedade moderna/colonial/capitalista, porém, não pode significar desarticular aquela crítica anterior. É preciso conjugar as lutas, compreendendo qual oraganização popular é capaz de estar no timão deste processo. Dessa forma, precisamos apostar em um sujeito histórico da transformação popular, ainda que esta aoposta não signifique obscurecer suas contradições. Sem dúvidas, os oprmidos também são opressores, na medida em que REPRODUZEM a opressão que sofrem. Mas estas opressões são substancialmente distintas, na medida em que dizem respeito, quanto a seu nascimento, a sujeitos históricos diversos. Uns as produzem; outras as reproduzem. Se, por um lado, Paulo Freire dizia que os oprimidos também hospedavam em sua inconclusividade humana a opressão, também era ele quem dizia, por outro lado, que só os oprimidos, em comunhão, poderiam libertar os opressores. E neste momento, sua análise dialética assume um lugar de enunciação da fala, um sujeito histórico que não é a humanidade sem cortes: são os oprimidos entendidos como classe popular.

    Bom, acho que me alonguei, mas esta é minha respeitosa opinião.

    Um abraço a todos

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  5. Eu vou destacar alguns pontos da "fala" do Pazello:

    "Daí a necessidade de pensarmos a crítica jurídica como atuando nos espaços de resistência político-jurídicos estatais"

    Bom, acho que essa é questão central na nossa prática cotidiana: buscar agir, de algum modo de forma crítica, o que pode requerer um exercício de força de vontade e imaginação que ultrapasse o comum. É só uma observação, porque às vezes por imposição/necessidade nos submetemos à práticas jurídicas( no sentido estatal,mesmo) a principio castradoras e reprodutoras de erros e injustiças, mas que podem ser transformadas por quem decide optar por ela- trabalho remunerado e estágio curricular, por exemplo. E, é claro que estou indo além (ou aquém) da assessoria jurídica popular. Porque eu acredito( e isso é uma opinião bem pessoal) que o trabalho de formiguinha, por dentro do sistema- e é normalmente onde estamos por conta de nossa opção acadêmica- também pode ser útil. Mas é claro que não sou ingênua de achar que é a mesma coisa que atuar diretamente com os oprimidos, que as consequências seriam as mesmas. Entretanto, isso é uma situação que muitos de nós temos que lidar. O que fazer, então?

    "(...)isto não desnatura o fato de que este seja um modo de produção total, que abarca toda a produção da vida atual, de forma hegemônica."

    Não nego isso, Pazello. E sua lembrança é muito válida. O que me preocupa é que essas questões que você ressaltou: racismo e patriarcalismo e seus terríveis desdobramentos continuem sendo transmitidas de sistema a sistema, seja ele capitalista ou outro que vier.

    É isso.

    Xeru, piá!

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  6. Companheira Naiara!

    O trabalho de formiguinha é importante, contanto que não se perca a noção do todo. E é muito fácil perdê-la se agimos isoladamente, tendo por arma apenas nossa boa vontade.

    Quanto à transmissão de sistema para sistema, concordo: é preocupante o corte racial e patriarcal se reproduzir sempre. Mas também é bastante preocupante o corte de classes. Isso quer dizer o que: não há luta de classes apenas quando há capitalismo. A tendência à luta entre burgueses e proletários é histórica e não universal. É um confronto contextual. Mas a opressão econômica não é uma especificidade do modo de produção de capitalista. E quanto a ela devemos continuar sempre atentos!

    Um abraço da terra das araucárias

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