quinta-feira, 25 de junho de 2015

Estudo de caso sobre promoção de direitos coletivos

Dois juristas populares profissionais exploram um caso de promoção de direitos coletivos com uma ação de reivindicação por um particular. Quais seriam os limites da ação técnica e política na assessoria jurídica popular? Trata-se de texto da coluna AJP na Universidade, que reúne os resultados da turma de “Teorias Críticas do Direito e Assessoria Jurídica Popular”, da Especialização em Direitos Sociais do Campo da UFG, na Cidade de Goiás.

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Assessoria jurídica popular: um estudo de caso

Alessandra Rodrigues de Jesus
Natanael Santiago David

Cumpre inicialmente destacar que a assessoria jurídica popular propõe-se a um intenso diálogo com os movimentos sociais rumo a transformação da realidade social. Isto impõe aos juristas populares profissionais ou profanos desafios de múltipla ordem. Mencionaremos aqui a dimensão prática de um trabalho com vistas à promoção da Reforma Agrária, por meio de criação de mais um assentamento para trabalhadores rurais sem-terra.

Trata-se de um caso que, em princípio, nada tem que ver com a promoção de direitos coletivos. Mas, em função de uma densa articulação levada a cabo por juristas populares, aponta para benesses de ordem coletiva. O caso implica num trabalho técnico jurídico com uma Ação de Reivindicação que, uma vez exitosa, culminará na criação de um assentamento beneficiando uma coletividade razoável.

A ação reivindica o domínio de um imóvel que está em poder de uma empresa rural no Estado de Goiás, e que supostamente fora grilada. Puxando a cadeia dominial do imóvel chega-se à sua origem, que se deu em tese mediante fraude na procuração em que o legítimo proprietário passa poderes para um terceiro dispor da área. Tudo estaria em perfeita ordem, não fosse a procuração estar datada posteriormente ao óbito do outorgante, donde se poderá concluir no processo judicial pela flagrante grilagem de terra.

Hoje é um particular que figura no pólo ativo da ação. Não fosse o seu compromisso político com o MST em negociar a área com o INCRA, com vistas à constituição de um assentamento, em nada demandaria a atuação da assessoria jurídica popular. O desafio é tecer uma atuação técnica impecável para o sucesso da causa. Se exitosa esse particular poderá vender o imóvel em litígio ao INCRA para o fim já mencionado.

Pensamos que é aqui que entra o peculiar trabalho da assessoria jurídica popular. Com vistas à criação da necessária articulação técnico-jurídica e, sobretudo, política. Exigidas não só para o êxito da ação judicial mas, mormente, para a garantia do compromisso firmado pelo reivindicante em dispor o imóvel para a Reforma Agrária.


Apresenta-se uma correlação dialética entre fazer uso do direito posto e buscar a efetividade do direito não posto. Consigne-se que o reivindicante, descrente na atuação de outros advogados, procurou os acampados solicitando indicação de advogado do MST, oportunidade em que o pacto foi firmado.

Tal pacto não encontra amparo algum na ordem legal vigente. Contudo, dadas as circunstâncias nas quais foi engendrado é de bom grado apostar em sua efetiva execução. Esta, é claro, condicionada ao êxito da causa judicial.

Vislumbra-se uma prática informal, não-oficial, num espaço sociopolítico que tem sua razão de ser na necessidade material dos acampados de serem assentados. Abre-se espaço, ainda, para um particular também viabilizar seus interesses. Estes funcionando como “correia de transmissão” para a efetividade do direito dos oprimidos.

Estamos por descobrir qual teoria crítica do direito amolda-se ao caso que foi colocado. Parece-nos existir estreita relação ao que é preconizado pelo pluralismo jurídico e/ou pelo direito insurgente. Independente de divagação teórica, fato é que a militância na assessoria jurídica popular está sempre a nos aturdir com a complexidade que se revela diuturnamente pela realidade da luta e da vida dos oprimidos.


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