Dois juristas populares profissionais exploram um caso de
promoção de direitos coletivos com uma ação de reivindicação por um particular.
Quais seriam os limites da ação técnica e política na assessoria jurídica
popular? Trata-se de texto da coluna AJP na Universidade, que reúne os resultados da turma de “Teorias Críticas
do Direito e Assessoria Jurídica Popular”, da Especialização em Direitos Sociais
do Campo da UFG, na Cidade de Goiás.
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Assessoria jurídica popular: um estudo de caso
Alessandra Rodrigues de Jesus
Natanael Santiago David
Cumpre inicialmente destacar que a assessoria jurídica
popular propõe-se a um intenso diálogo com os movimentos sociais rumo a transformação
da realidade social. Isto impõe aos juristas populares profissionais ou
profanos desafios de múltipla ordem. Mencionaremos aqui a dimensão prática de
um trabalho com vistas à promoção da Reforma Agrária, por meio de criação de
mais um assentamento para trabalhadores rurais sem-terra.
Trata-se de um caso que, em princípio, nada tem que ver com
a promoção de direitos coletivos. Mas, em função de uma densa articulação
levada a cabo por juristas populares, aponta para benesses de ordem coletiva. O
caso implica num trabalho técnico jurídico com uma Ação de Reivindicação que,
uma vez exitosa, culminará na criação de um assentamento beneficiando uma
coletividade razoável.
A ação reivindica o domínio de um imóvel que está em poder de
uma empresa rural no Estado de Goiás, e que supostamente fora grilada. Puxando
a cadeia dominial do imóvel chega-se à sua origem, que se deu em tese mediante
fraude na procuração em que o legítimo proprietário passa poderes para um
terceiro dispor da área. Tudo estaria em perfeita ordem, não fosse a procuração
estar datada posteriormente ao óbito do outorgante, donde se poderá concluir no
processo judicial pela flagrante grilagem de terra.
Hoje é um particular que figura no pólo ativo da ação. Não
fosse o seu compromisso político com o MST em negociar a área com o INCRA, com
vistas à constituição de um assentamento, em nada demandaria a atuação da
assessoria jurídica popular. O desafio é tecer uma atuação técnica impecável
para o sucesso da causa. Se exitosa esse particular poderá vender o imóvel em
litígio ao INCRA para o fim já mencionado.
Pensamos que é aqui que entra o peculiar trabalho da
assessoria jurídica popular. Com vistas à criação da necessária articulação técnico-jurídica
e, sobretudo, política. Exigidas não só para o êxito da ação judicial mas,
mormente, para a garantia do compromisso firmado pelo reivindicante em dispor o
imóvel para a Reforma Agrária.
Apresenta-se uma correlação dialética entre fazer uso do
direito posto e buscar a efetividade do direito não posto. Consigne-se que o
reivindicante, descrente na atuação de outros advogados, procurou os acampados
solicitando indicação de advogado do MST, oportunidade em que o pacto foi
firmado.
Tal pacto não encontra amparo algum na ordem legal vigente.
Contudo, dadas as circunstâncias nas quais foi engendrado é de bom grado
apostar em sua efetiva execução. Esta, é claro, condicionada ao êxito da causa
judicial.
Vislumbra-se uma prática informal, não-oficial, num espaço
sociopolítico que tem sua razão de ser na necessidade material dos acampados de
serem assentados. Abre-se espaço, ainda, para um particular também viabilizar
seus interesses. Estes funcionando como “correia de transmissão” para a
efetividade do direito dos oprimidos.
Estamos por descobrir qual teoria crítica do direito
amolda-se ao caso que foi colocado. Parece-nos existir estreita relação ao que
é preconizado pelo pluralismo jurídico e/ou pelo direito insurgente.
Independente de divagação teórica, fato é que a militância na assessoria
jurídica popular está sempre a nos aturdir com a complexidade que se revela
diuturnamente pela realidade da luta e da vida dos oprimidos.
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Leia também:
Cadernos insurgentes e o caso do MP/RS versus MST 2008, 27
nov. 2013
Nossas lutas e conquistas, 30 mai. 2011
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