quinta-feira, 11 de junho de 2015

Direito insurgente e pluralismo jurídico na advocacia popular

Uma análise do Direito em relação ao povos indígenas aprofundando a multiculturalidade e a plurietnicidade é o objetivo deste texto. Importante reflexão para ser feita nesta semana, já que no dia 7 de junho de 1989 a OIT adotava a Convenção 169 sobre povos indígenas e tribais. Rafael Modesto dos Santos é Bacharel em Direito na UFG e assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário. Trata-se de texto da coluna AJP na Universidade, que reúne os resultados da turma de “Teorias Críticas do Direito e Assessoria Jurídica Popular”, da Especialização em Direitos Sociais do Campo da UFG, na Cidade de Goiás.



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Direito insurgente e pluralismo jurídico: a relação do Direito natural indígena e a advocacia popular

Rafael Modesto dos Santos

A insurgência de um pluralismo jurídico após os processos constituintes, e a possibilidade de construção de novas tendências heterogêneas de direitos, vem ao encontro de questões de grande relevância social. Veja a realidade dos Povos Tradicionais, mais especificamente os Povos Indígenas do Brasil, e as suas relações de luta por direitos constitucionais e pela aplicabilidade dessa previsão fundamental depois de grandes conquistas, no período de 1987 a 1988.
A contento das relevantes conquistas dos Povos Indígenas na Constituinte e a efetivação de dois artigos, 231 e 232, na Constituição Federal de 1988, a abrangência desses direitos (tradição, cultura, crença, língua, território etc) ainda pende de avanço. A sua luta hoje não é pela efetivação desses direitos, tão somente, mas também pela sua manutenção. Visto a essência das forças conservadoras que vão de encontro aos direitos conquistados a custo de derramamentos históricos de sangue dos mais diferentes povos e etnias.

Acontece que na cruel realidade dessas minorias seus direitos estão longe de ter íntima relação com as tradições e culturas dos índios. Veja que há de fato uma complexidade social e uma vastidão de possíveis direitos a serem reconhecidos entre os Povos Tradicionais. Essa heterogeneidade que comporta uma gama de direitos é a essência de uma sociedade plural; ou da profundeza do direito insurgente; ou, se preferir, do pluralismo jurídico.
Cabendo à advocacia popular a luta pela efetivação dos direitos indígenas e,  ademais, a luta pela manutenção dos desses direitos ante as forças conservadoras. Cabe também a mesma luta à categoria de defensores de direitos humanos, pela construção do caminho para o reconhecimento estatal do direito plural e, mais, do Estado plural, multicultural e pluriétnico.
A assessoria aos índios é quinhoeira da luta pelo avanço do Estado enquanto multicultural e pluriétnico, e pela efetivação dos direitos como tais. Os exemplos de países latino-americanos como a Bolívia e Equador são demonstrações de que é possível o reconhecimento de um direito já existente. Porém, o Estado brasileiro teima em não reconhecer essa diversidade.
A advocacia popular se encontra nessa fenda histórica de não-reconhecimento e supressão de direitos das minorias. Os índios e suas mais variadas facetas de multi e pluriculturalidade são muitos povos e, por isso, muitas culturas, crenças, tradições e línguas diferentes. A advocacia popular tem o papel de contribuir com essa construção e elaboração de um direito insurgente, de um pluralismo que avança sobre o campo do direito e da justiça distributiva.

Destarte, a insurgência de uma faceta jurídica de caráter plural e multicultural é da essência de uma sociedade que de fato é plural. Apenas faltante para essa o reconhecimento dessa existência. Aí se encontra verdadeiro papel do jurista e da advocacia popular junto às minorias: sejam negros e quilombolas, LGBTS, desempregados, sem terras, índios e qualquer outra minoria que sofre com a brutalidade do Estado homogêneo e juridicamente engessado.

O direito insurgente que emana das forças de resistência das minorias é a essência da contribuição jurídica da advocacia popular. Se o direito nega direitos, a insurgência da multiculturalidade e da plurietnicidade pode ser o elemento para o debate na sociedade à caminho do reconhecimento do Estado enquanto multicultural e pluriétnico, como a forma mais real do direito essencialmente plural.

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Leia também:
Direito insurgente e pluralismo jurídico, Luiz Otávio Ribas, 6 out 2010
AJP/AJUP com povos indígenas?, Assis Oliveira, 9 fev. 2010
Direito e antropologia, Ricardo Pazello, 12 abr. 2011

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