João Baptista Herkenhoff
A advocacia e a magistratura têm códigos de ética
diferentes.
Há deveres comuns aos dois encargos como, por exemplo, o
amor ao trabalho, a pontualidade, a urbanidade, a honestidade.
Quanto à pontualidade, os advogados são ciosos de que não
podem dormir no ponto. Sabem das consequências nefastas de eventuais atrasos.
Os clientes podem ser condenados à revelia se os respectivos defensores não
atendem ao pregão.
Já relativamente aos juízes, nem sempre compreendem que
devem ser atentos aos prazos. Fazem tabula rasa da advertência de Rui Barbosa:
“Justiça tardia não é Justiça, senão injustiça qualificada.”
Vamos agora aos pontos nos quais deveres de advogados e
juízes não são coincidentes.
O juiz deve ser imparcial. É seu mais importante dever, pois
é o fiel da balança. Se o juiz de futebol deve ser criterioso ao marcar faltas,
ou anular gols, quão mais criterioso deve ser o Juiz de Direito que decide
sobre vida, honra, família, bens.
João Batista Herkenhoff |
Já o advogado é sempre parcial, daí que se chama “advogado
da parte”. Deve ser fiel a seu cliente e leal na relação com o adversário.
O juiz deve ser humilde. A virtude da humildade só faz
engrandecê-lo. Não é pela petulância que o juiz conquista o respeito da
comunidade. Angaria respeito e estima na medida em que é digno, reto, probo. A
toga tem um simbolismo, mas a toga, por si só, de nada vale. Uma toga
moralmente manchada envergonha, em vez de enaltecer.
O juiz deve ser humano, cordial, fraterno. Deve compreender
que a palavra pode mudar a rota de uma vida. Diante do juiz, o cidadão comum
sente-se pequeno. O humanismo pode diminuir esse abismo, de modo que o cidadão
se sinta pessoa, tão pessoa e ser humano quanto o próprio juiz.
A função de ser juiz não é um emprego. Julgar é missão, é
empréstimo de um poder divino. Tenha o juiz consciência de sua pequenez diante
da tarefa que lhe cabe. A rigor, o juiz deveria sentenciar de joelhos.
As decisões dos juízes devem ser compreendidas pelas partes
e pela coletividade. É perfeitamente possível decidir as causas, por mais
complexas que sejam, com um linguajar que não roube dos cidadãos o direito de
compreender as razões que justificam as conclusões.
Juízes e advogados devem ser respeitosos no seu
relacionamento. Compreendam os juízes que os advogados são indispensáveis à
prática da Justiça. É totalmente inaceitável que um magistrado expulse da sala
de julgamento um advogado, ainda que esse advogado seja impertinente nas suas
alegações, desarrazoado nos seus pedidos. Quando um fato desta natureza ocorre,
não podemos omitir o protesto.
João Baptista Herkenhoff, 78 anos, magistrado
aposentado, Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo, escritor,
palestrante. Autor de: Dilemas de um juiz: a aventura obrigatória (Rio, GZ
Editora).
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