quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Entrevista com José Pepe Mujica

















Para você que está preocupado com o destino da política na América Latina e acredita que este passa pelas eleições presidenciais segue entrevista com José Pepe Mujica, candidato favorito a assumir a Presidência do Uruguai.

A música que introduz o vídeo é "A redoblar", de Mauricio Ubal y Ruben Olivera, interpretada pelo grupo RUMBO. O ritmo é o candombe - ritmo popular de celebração e protesto.

Mujica deu esta entrevista a Flávio Aguiar, para a TV Carta Maior, publicada em 12 de fevereiro de 2005, na ocasião da eleição de Tabaré Vásquez.


José Pepe Mujica fez parte do movimento Tupamaro de resistência à ditadura uruguaia.

Mujica acredita que o Uruguai é um país pequeno, mas de tradição, muita cultura, liberal no sentido político e o mais equitativo historicamente num continente injusto. Fala sobre a função da esquerda política no Uruguai de agregar forças e criar uma cultura de negociação.

Para ele, a luta nos anos de repressão política é uma lição de vida que tem que ser transmitida para os mais jovens. Diz que vivemos numa conjuntura política favorável na América Latina, pois alguns governantes têm vontade política decente para aplicação dos recursos dos países. Aborda os problemas econômicos e sociais do país, apontando como o principal a utilização da capacidade ociosa, geração de trabalho. Fala da importância do campo universitário para a independência econômica, a propriedade da inteligência para a produção de conhecimento próprio. Aborda, por fim, a importância de assumir o Ministério da Agricultura e os desafios de enfrentar a imprensa de direita.


Muito interessante a proposta do jornalista Flávio Aguiar, de postar esta entrevista na véspera das eleições deste ano, para que façamos as comparações dos discursos em 2005 e 2009.

Ver artigo de Flávio Aguiar "Uruguai: quanto vale uma tradição republicana".


segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Manifesto em defesa do MST


Manifesto em defesa do MST

Contra a violência do agronegócio e a criminalização das lutas sociais
As grandes redes de televisão repetiram à exaustão, há algumas semanas, imagens da ocupação realizada por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em terras que seriam de propriedade do Sucocítrico Cutrale, no interior de São Paulo. A mídia foi taxativa em classificar a derrubada de alguns pés de laranja como ato de vandalismo.
Uma informação essencial, no entanto, foi omitida: a de que a titularidade das terras da empresa é contestada pelo Incra e pela Justiça. Trata-se de uma grande área chamada Núcleo Monções, que possui cerca de 30 mil hectares. Desses 30 mil hectares, 10 mil são terras públicas reconhecidas oficialmente como devolutas e 15 mil são terras improdutivas. Ao mesmo tempo, não há nenhuma prova de que a suposta destruição de máquinas e equipamentos tenha sido obra dos sem-terra.
Na ótica dos setores dominantes, pés de laranja arrancados em protesto representam uma imagem mais chocante do que as famílias que vivem em acampamentos precários desejando produzir alimentos.
Bloquear a reforma agrária
Há um objetivo preciso nisso tudo: impedir a revisão dos índices de produtividade agrícola – cuja versão em vigor tem como base o censo agropecuário de 1975 – e viabilizar uma CPI sobre o MST. Com tal postura, o foco do debate agrário é deslocado dos responsáveis pela desigualdade e concentração para criminalizar os que lutam pelo direito do povo. A revisão dos índices evidenciaria que, apesar de todo o avanço técnico, boa parte das grandes propriedades não é tão produtiva quanto seus donos alegam e estaria, assim, disponível para a reforma agrária.
Para mascarar tal fato, está em curso um grande operativo político das classes dominantes objetivando golpear o principal movimento social brasileiro, o MST. Deste modo, prepara-se o terreno para mais uma ofensiva contra os direitos sociais da maioria da população brasileira.
O pesado operativo midiático-empresaria l visa isolar e criminalizar o movimento social e enfraquecer suas bases de apoio. Sem resistências, as corporações agrícolas tentam bloquear, ainda mais severamente, a reforma agrária e impor um modelo agroexportador predatório em termos sociais e ambientais, como única alternativa para a agropecuária brasileira.
Concentração fundiária
A concentração fundiária no Brasil aumentou nos últimos dez anos, conforme o Censo Agrário do IBGE. A área ocupada pelos estabelecimentos rurais maiores do que mil hectares concentra mais de 43% do espaço total, enquanto as propriedades com menos de 10 hectares ocupam menos de 2,7%. As pequenas propriedades estão definhando enquanto crescem as fronteiras agrícolas do agronegócio.
Conforme a Comissão Pastoral da Terra (CPT, 2009) os conflitos agrários do primeiro semestre deste ano seguem marcando uma situação de extrema violência contra os trabalhadores rurais. Entre janeiro e julho de 2009 foram registrados 366 conflitos, que afetaram diretamente 193.174 pessoas, ocorrendo um assassinato a cada 30 conflitos no 1º semestre de 2009. Ao todo, foram 12 assassinatos, 44 tentativas de homicídio, 22 ameaças de morte e 6 pessoas torturadas no primeiro semestre deste ano.
Não violência
A estratégia de luta do MST sempre se caracterizou pela não violência, ainda que em um ambiente de extrema agressividade por parte dos agentes do Estado e das milícias e jagunços a serviço das corporações e do latifúndio. As ocupações objetivam pressionar os governos a realizar a reforma agrária.
É preciso uma agricultura socialmente justa, ecológica, capaz de assegurar a soberania alimentar e baseada na livre cooperação de pequenos agricultores. Isso só será conquistado com movimentos sociais fortes, apoiados pela maioria da população brasileira.
Contra a criminalização das lutas sociais
Convocamos todos os movimentos e setores comprometidos com as lutas a se engajarem em um amplo movimento contra a criminalização das lutas sociais, realizando atos e manifestações políticas que demarquem o repúdio à criminalização do MST e de todas as lutas no Brasil.
Assinam esse documento:
Eduardo Galeano - Uruguai
István Mészáros - Inglaterra
Ana Esther Ceceña - México
Boaventura de Souza Santos - Portugal
Daniel Bensaid - França
Isabel Monal - Cuba
Michael Lowy - França
Claudia Korol - Argentina
Carlos Juliá – Argentina
Miguel Urbano Rodrigues - Portugal
Carlos Aguilar - Costa Rica
Ricardo Gimenez - Chile
Pedro Franco - República Dominicana
Brasil:
Antonio Candido
Ana Clara Ribeiro
Anita Leocadia Prestes
Andressa Caldas
André Vianna Dantas
André Campos Búrigo
Augusto César
Carlos Nelson Coutinho
Carlos Walter Porto-Gonçalves
Carlos Alberto Duarte
Carlos A. Barão
Cátia Guimarães
Cecília Rebouças Coimbra
Ciro Correia
Chico Alencar
Claudia Trindade
Claudia Santiago
Chico de Oliveira
Demian Bezerra de Melo
Emir Sader
Elias Santos
Eurelino Coelho
Eleuterio Prado
Fernando Vieira Velloso
Gaudêncio Frigotto
Gilberto Maringoni
Gilcilene Barão
Irene Seigle
Ivana Jinkings
Ivan Pinheiro
José Paulo Netto
Leandro Konder
Luis Fernando Veríssimo
Luiz Bassegio
Luis Acosta
Luisa Santiago
Lucia Maria Wanderley Neves
Marcelo Badaró Mattos
Marcelo Freixo
Marilda Iamamoto
Mariléa Venancio Porfirio
Mauro Luis Iasi
Maurício Vieira Martins
Otília Fiori Arantes
Paulo Arantes
Paulo Nakatani
Plínio de Arruda Sampaio
Plínio de Arruda Sampaio Filho
Renake Neves
Reinaldo A. Carcanholo
Ricardo Antunes
Ricardo Gilberto Lyrio Teixeira
Roberto Leher
Sara Granemann
Sandra Carvalho
Sergio Romagnolo
Sheila Jacob
Virgínia Fontes
Vito Giannotti
Para subscrever esse manifesto, clique no link:

Assessoria Jurídica e ENADE

A assessoria tem se desenvolvido por meio de muito esforço estudantil e docente. Recentemente presencio uma mudança muito drástica nas instituições de ensino privado que leciono. Todas estão voltando suas avaliações e metodologia de ensino para a realização do ENADE. Desde provas diretamente voltadas ao modelo da prova do ENADE até "simulados" (pasmem) para melhorar o desempenho dos seus alunos na prova. Como critério de avaliação e "quantificação de qualidade"(?)(outro absurdo lógico?) universitária o ENADE converteu-se no objetivo do ensino (conciliado com outros concursos como Exame da Ordem, etc.).

A questão em pauta é se o ENADE é uma avaliação realmente preocupada com a qualidade da educação universitária garantida na constituição. O ENADE avalia conteúdos. E os conteúdos parecem ter "vida própria". Devem ser verificados em si mesmos. Somente competências puramente "profissionalizantes" são avaliadas, desde competência de interpretação e análise de textos, até a competência de raciocínio lógico são testadas (!). E por mais que o tema da questão seja "direitos humanos" ou "cidadania", tais questões são resumidas em "conteúdos" a serem repetidos (papagaiados) sem nenhuma ligação com prática ou ação social.

Mas como avaliar o comprometimento institucional com a Cidadania? Ou com o pleno desenvolvimento da pessoa?

Somando número de projetos de extensão, alunos participantes e horas distribuídas (quase sempre fantasmas ou de caridade assistencial)?

Ou será que vamos cumprir apenas um dos três objetivos educacionais da Constituição "o preparo para o mercado de trabalho".

A maioria absoluta das instituições de ensino privado do curso de Direito não tem política de extensão ou de pesquisa. Não tem professores remunerados para nenhuma atividade além do ensino de sala de aula. O regime "horista" prepondera em todas as instituições de ensino privado (e se existir alguma faculdade diferente avisem-me que quero mandar meu currículo). E transformam o ensino superior numa banal continuidade de um modelo de ensino bancário.

Durante a faculdade fui obrigado (tá amarelei!) a fazer provão. Na verdade estava na campanha de boicote ao provão em minha turma. Fui quase excomungado do meio universitário "porque se a nota da instituição federal ficar abaixo do setor privado estaremos dando todo o argumento para esse ensino mercantilista impor-se como superior ou de melhor qualidade". Fiz por pressão. E até hoje me arrependo.

Sinceramente. Ter feito o provão não mudou em nada minha vida. A instituição que me formei também não teve grande "melhoria" ou "piora" graças as notas altíssimas que sempre tirou nesse tipo de avaliação.

Agora, por outro lado, o autoritarismo da "obrigatoriedade" da realização do ENADE deixa as coisas ainda piores. E a democracia mais comprometida ainda. Não existe espaço sequer para pensar diferente. E a pressão sempre é gigantesca.

O ENADE é uma mentira e existem muitas outras maneiras de se avaliar as instituições.

O modelo que existe serve apenas para reforçar um modelo de ensino universitário que bloqueia qualquer ação cidadã e de transformação social real.

Acredito que somente com uma manifestação realmente coletiva essa avaliação hipócrita ao menos será contestada e o debate público servirá para modificar alguma coisa. Nem que seja visão de consenso em relação a necessidade de quantificar faculdades.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Artigo Jacques Alfonsin e Antonio Cechin 4

Como de praxe, postamos neste blogue a coluna semanal de Jacques Alfonsin e Antonio Sechin no sítio do Instituto Humanitas da Unisinos.

No artigo desta semana, "Entre laranjeiras derrubadas e terras roubadas", o advogado popular e o religioso abordam o fato envolvendo a ocupação da fazenda Cutrale por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), em São Paulo.

Com o artigo, eles se somam a outras poucas vozes que insurgiram-se à cobertura jornalística da imprensa televisiva brasileira do fato. Assim como apontam as contradições desta cobertura, na necessária defesa dos movimentos sociais.

Leia ainda o editorial do IHU sobre a publicação "Direito Achado na Rua", com entrevista com Jacques Alfonsin.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Contribuições insurgentes por um direito transformador

Ocorreu no final do mês de setembro a 44ª Semana Acadêmica de Estudos Jurídicos e Sociais da UFPel, este ano com o tema "Resistência e Justiça para a Autonomia", no Salão de Atos da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pelotas, Rio Grande do Sul.

Este é o cartaz de divulgação do evento, onde constam homens e mulheres que lutaram na resistência contra opressão e por um mundo com mais autonomia, como Gandhi, Luther King, Luís Carlos Prestes, Harvey Milk, "o camponês", "a índia", Nelson Mandela, Rosa Luxemburgo e Antonio Cândido (os outros dois eu não consegui identificar). No centro está a justiça derrotada e aprisionada, com o mapa mundi ao fundo.

Participei das atividades com uma palestra intitulada "Contribuições insurgentes para um direito transfomador", em que busquei contribuir com o debate sobre a assessoria estudantil na cidade de Pelotas, em virtude de duas recentes iniciativas: o Núcleo de Assessoria Popular - NAP da UCPel, e o Serviço Universitário Resistência e Justiça para a Autonomia - SURJA da UFpel.

A Semana Acadêmica estava muito bem organizada, os temas estavam bastante críticos e instigantes, a programação diversificada incluiu palestras, oficinas, apresentações de trabalho, debate de filmes e apresentações artísticas.

O Centro Acadêmico Ferreira Viana está de parabéns!

domingo, 4 de outubro de 2009

Falece Herrera Flores


No dia 2 de outubro de 2009 faleceu Joaquín José Herrera Flores em Sevilha, Espanha.
Foi professor de direito no programa de doutorado da Universidade Pablo de Olavide, na mesma cidade.

Concedeu entrevista há alguns meses para um jornal da UnB, intitulada "A reinvenção dos direitos humanos".

Autor de inúmeras obras sobre os direitos humanos, Herrera Flores vinha muito ao Brasil, quando proferia palestras e minicursos sobre seu principal tema de pesquisa: a cultura e os direitos humanos.

Aqui estão alguns títulos:

HERRERA FLORES, Joaquín. Los derechos humanos desde la escuela de Budapeste. Madrid: Tecnos, 1989.
__________(Org.). El vuelo del anteo: derechos humanos y crítica de la razón liberal (1998). Bilbao: Desclée de Brouwer, 2000.
__________. El processo cultural: materiales para la creatividad humana. Sevilla: Aconcagua libros, 2005.
__________. De 'habitaciones proprias' y otros espacios negados: una teoría crítica pelas opresiones patriarcales. Bilbao: Instituto de Derechos Humanos de Universidad de Deusto, 2005.
__________. Los derechos humanos como productos culturales: crítica del humanismo abstracto. Madrid: Catarata, 2005.

As obras editadas no Brasil foram:

HERRERA FLORES, Joaquín; SÁNCHEZ RUBIO, David; CARVALHO, Salo de (Orgs.). Direitos Humanos e Globalização: fundamentos e possibilidades desde a teoria crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.
HERRERA FLORES, Joaquín. Direitos Humanos, interculturalidade e racionalidade de resistência. In: WOLKMER, Antonio Carlos. Direitos Humanos e Filosofia Jurídica na América Latina. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 359-385.
ANUÁRIO 2004/2005: da Escola Superior da Magistratura do Rio grande do Sul – Ajuris. Jurisdição e direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. v. 01, Tomo II.
HERRERA FLORES, Joaquín. Manifesto inflexivo: considerações intempestivas por uma cultura radical. In: OLIVEIRA DE MOURA, Marcelo. Irrompendo no real: escritos de teoria crítica dos direitos humanos. Pelotas: Educat, 2005, p. 261-275.
HERRERA FLORES, Joaquín. A (re)invenção dos direitos humanos. Florianópolis: Boiteux, 2009.

Sentiremos muito a falta do mestre, com seu sorriso fácil e sua fala amorosa e magnética.

"Já faz tempo que escolhi"

O poema a seguir foi escrito por Thiago de Mello em 1981. Ele trata com cuidado e beleza da escolha política pela luta ao lado dos deserdados e dos feridos de injustiça.

Amadeu Thiago de Mello nasceu na pequenina cidade de Barreirinha, Amazonas, quase na fronteira do Pará, em 1926.


Já faz tempo que escolhi
Thiago de Mello

A luz que me abriu os olhos para a dor dos deserdados
e os feridos de injustiça
não me permite fechá-los nunca mais
enquanto viva.

Mesmo que de asco ou fadiga me disponha a não ver mais
ainda que o medo costure os meus olhos
já não posso deixar de ver
a verdade me tocou
com sua lâmina de amor
o centro do ser.

Não se trata de escolher entre cegueira e traição.

Mas entre ver e fazer de conta que nada vi
ou dizer da dor que vejo para ajudá-la a ter fim
já faz tempo que escolhi.