Os assessores populares hoje preocupam-se com a crítica ao ensino jurídico. Ademais, muitos preocupam-se também com a construção de uma universidade popular brasileira.
Além de nos perguntarmos sobre o nosso papel neste processo, precisamos estar conscientes da necessidade desta luta.
O ensino universitário hoje no Brasil é um privilégio de uma parcela muito pequena da sociedade.
Apesar de alguns pequenos avanços em políticas públicas no sentido de ampliação do acesso ao ensino formal universitário, estas são insuficientes para reverter o quadro de dificuldades no acesso à escolaridade superior dos brasileiros e brasileiras. Outro problema, é que na luta pelo acesso ao ensino formal universitário estatal, não estamos, necessariamente, construindo uma proposta de universidade popular.
Inicialmente, pode-se afirmar que inúmeras iniciativas de movimentos sociais, pelo menos desde a década de 1960, apontam para um horizonte de transformação: a proposta da universidade dos movimentos populares.
A construção de uma universidade popular é algo mais radical e amplo do que pode-se imaginar num primeiro momento.
A educação superior, hoje, é organizada pelo Estado brasileiro, que concede à iniciativa privada a autonomia necessária para explorar economicamente, também, o ensino universitário. Hoje no Brasil, o ensino universitário é monopólio do Estado, ainda que confira a agentes privados a possibilidade de exploração desta atividade. Neste contexto, a esmagadora maioria das instituições de ensino superior são privadas, o que não modifica a situação de monopólio estatal sobre a educação superior. Uma pequena parcela destas instituições privadas é composta de instituições comunitárias, que ganham com a redução de tributos e compensam, pela lei, com projetos em benefício da comunidade.
Quero trabalhar com a idéia de que todas as instituições de ensino superior brasileiras, públicas, privadas, comunitárias, seguem a mesma lógica: a educação superior como privilégio de poucos e monopólio do estado. Assim, todas seguem a lógica do Estado, que é de manutenção das relações sociais tal qual elas estão: um regime econômico capitalista e um direito liberal e monista que sustente este regime econômico.
Por sua vez, os movimentos sociais têm reagido com duas propostas, não contraditórias, no sentido de ampliar o acesso ao ensino formal: uma, a construção da universidade popular; outra, de amplicação dos espaços no ensino formal. Isto quer dizer que a universidade popular não passa pelo ensino formal. Mas, para sua construção, é preciso pensar estrategicamente a ampliação dos espaços formais. Podemos pensar na turma especial de direito para assentados e integrantes de movimentos sociais no campo na UFG, por exemplo.
O movimento estudantil tem contribuído muito com esta proposta, em diferentes níveis de comprometimento com outros movimentos.
Na década de 1960, tínhamos a União Nacional dos Estudantes, por meio dos Círculos de Cultura (CUCAs) colaborando com projetos de educação popular pelo interior do Brasil. Estes uniam-se a outros movimentos de educação popular e arte, como o Movimento de Educação Popular, criado por Paulo Freire; assim como o Movimento Educação de Base (MEB), ligado à setores progressistas da igreja católica. Estes últimos com projetos de alfabetização e conscientização, que se não tivessem sido barrados pelo golpe militar em 1964, teriam contribuído sobremaneira para a educação do povo brasileiro. O próprio Paulo Freire tinha uma proposta de universidade popular, que passava também por iniciativas de extensão popular (comunicação) em projetos universitários de alfabetização, por exemplo, os que ocorreram ligados à UFPE.
Foi pensando no resgate destas iniciativas de educação popular que os estudantes de direito na década de 1990 organizaram-se em torno da Rede Nacional de Assessoria Jurídica Universitária (Renaju). A Rede tem como objetivo a organização de círculos de cultura voltados para o apoio à organização popular, com a comunicação sobre temas comuns a estudantes e movimentos sociais: o direito, o estado, construção da política de resistência e transformação.
Mas a Renaju não é a única iniciativa estudantil deste período. A Rede Popular de Estudantes de Direito (REPED) surgiu na década de 2000 como uma proposta dos movimentos sociais do campo e estudantes de direito, pela necessidade de apoio jurídico e para a construção de uma outra sociedade.
Além destas propostas, os movimentos sociais, como o MST, por exemplo, organiza ainda projetos de inserção no ensino formal, como as referidas turmas especiais, além das propostas de organização próprias do movimento, que conta com a participação de estudantes. É o caso da Assembléia Popular e as brigadas urbanas, que reúnem estudantes e outros militantes dos movimentos sociais, com um sentido de organização política mais avançado, com uma participação mais orgânica.
Incluem-se aí as propostas mais radicais para a construção de uma universidade popular. Os movimentos sociais brasileiros, principalmente o MST, reúnem-se em torno da construção de uma proposta própria de universidade, por meio de cursos nas escolas de formação e na organização da militância que frequenta cursos superiores.
Assim, é preciso que o movimento estudantil da assessoria desperte para a discussão da construção da universidade popular, conscientes da necessidade desta luta e dos caminhos que podem ser percorridos para a sua consolidação.
Só um adendo, Ribas. Não só o Direito. Eu diria manutenção de uma "ciência" que sustente esse regime econômico. É flagrante a instrumentalização de todos os ramos do conhecimento para servir aos interesses burgueses.
ResponderExcluirPara citar um exemplo, nesse contexto das "grandes obras" no nordeste, estão sendo arregimentados profissionais de diversas áreas para facilitar a negociação, através de pesquisas que buscam entender o que aquela comunidade quer para daí negociar com ela sobre as condições do deslocamento ou indenização pelo impacto da obra.
Pode parecer até uma atitude sensível por parte da empresa que faz isso, mas não o é. A idéia central é garantir que a obra seja feita. A antropologia, sociologia e psicologia estão sendo instrumentalizadas para isso.
Aqueles que exploram o trabalho alheio estão bem interados da discussão sobre a interdisciplinariedade, sabem que não é só com o direito que se ganha uma briga.