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quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Por que destinei meu salário para o fundo de greve dos trabalhadores da USP?

O blogue da AJP divulga carta de Jorge Luiz Souto Maior, sobre o contexto da greve da USP e das demais universidades estaduais paulistas.

Segue na íntegra:


Pediram-me para que explicitasse porque destinei meu salário para o fundo de greve dos trabalhadores da USP.

As razões são muitas e bastante óbvias.

Primeiro, porque a causa da greve é extremamente importante. Trata-se de uma luta pela dignidade e pelo efetivo funcionamento democrático de uma instituição pública.

Segundo, porque os ataques aos grevistas têm sido ilegais, desproporcionais, autoritários e ofensivos, culminando com o corte de salários que põe em risco a sobrevivência de muitos de nossos colegas de trabalho.

Terceiro, porque estive e estou durante todo esse tempo em greve, participando das atividades a ela relacionadas, e se alguns trabalhadores não vão receber seus salários não é justo que eu receba, ainda que a negação do salário seja ilegal e se caracterize, no caso, como ato antissindical e discriminatório.

Por fim, porque minha condição financeira momentânea me permite fazê-lo e ainda que essa importância me pudesse fazer alguma falta, mais falta me faria a minha consciência.

São Paulo, 06 de agosto de 2014.

Jorge Luiz Souto Maior
Professor da Faculdade de Direito USP

***

Conferir o Informagreve, blogue da greve das universidades estaduais paulistas.

sexta-feira, 7 de março de 2014

A propósito da greve dos garis


Sobre greve dos garis, no Rio de Janeiro, o texto do professor de direito do trabalho da USP é exemplar. Com o título de "Em defesa do direito de greve dos trabalhadores garis: o encontro do carnaval com sua história", o artigo de de Jorge Luiz Souto Maior passeia do contexto histórico, envolvendo samba, carnaval e trabalho, até chegar aos eventos que têm marcado a greve dos lixeiros durante e após o mais recente período carnavalesco, bem como as decisões jurássicas, porém tão atuais, da justiça trabalhista brasileira. Definitivamente, 2014 iniciou em junho de 2013 e o tempo da pasmaceira, entre as classes populares e trabalhadoras do Brasil, está encerrado. É hora de construir, política mais que juridicamente, a unidade em torno das bandeiras necessárias para esse novo momento em que o descenso das massas já se tornou dado sociológico a ser considerado em pesquisas históricas sobre a década de 2000.

A propósito da greve dos garis, então, compartilho em primeira mão o poema de Pedro Carrano, inspirado em Drummond e musicado por Amauta T. D. da Insurreição, "Drummond e a rosa do povo ou Do lixo nasceu uma flor", que integra o livro "Três vértebras e um primeiro testamento".

Aqui, vídeo e letra:


drummond e a rosa do povo 
(letra: Pedro Carrano; música: Amauta T. D. da Insurreição)

(Dm6 C#7+)
foi uma cena curiosa
que não se vê todo dia
o carro banhado de lixo
e muita gente ao redor
do lixeiro atropelado

(Fm6 Bb7/9)
coitado, tão apressado
não é dono do seu tempo 
entre um assobio e outro
vai socando lixo dentro
do caminhão terceirizado

(Em A9)
e depois corre maroto
como alguém que perde o trem
entre um assobio e outro,
se agarra no rabo do bicho
pra virar lixo também

(Dm6 C#7+)
foi descuido não há dúvida
ao saltar do caminhão
pra pegar o que caiu
buzina! e logo o chão
relaxou nosso lixeiro

(Dm6 Fm6)
que ficou por ali mesmo
(Dm6 Am7/9)
matando um pouco o serviço,
(Dm6 C#7+)
julgado nos comentários:

Dm6
“que lixeiro distraído,
Fm  Em Dm6 C#7+ Dm6
foi  atropelar o  carro!”

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Aulaço popular em Vigário Geral

No dia 29 de agosto de 1993, 21 pessoas foram assassinadas por policiais na chacina de Vigário Geral. Neste bairro, 19 anos depois, estávamos reunidos para debater o Direito, na assembléia da Associação de Moradores e Amigos de Vigário Geral - AMAVIG. O presidente João Ricardo, o JR, convocou vários lutadores e lutadoras do povo que relataram inúmeras outras atrocidades protagonizadas pelo Estado brasileiro. O mesmo JR, que junto com Antonio Ernesto, produziu o documentário "Não quero falar de chacina" (2005) para lembrar que nem só de tragédias é feita a história do bairro.

O depoimento da viúva Ângela sensibilizou professores, estudantes e moradores que lá estavam presentes. Ela contextualizou que era a primeira vez que relatava em público, no seu bairro, este fato doloroso que prefere esquecer. Disse que se agarrava no sucesso da filha para continuar vivendo. Então, fez a ressalva: "Minha filha escolheu uma dessas profissões que não tem muito valor: ela é professora".

Em meio a maior greve dos professores das universidades federais que o Brasil já teve, os grevistas que estavam presentes ficaram estarrecidos com a verdade que incomoda tal qual pedra no sapato. Como professor, sei que nosso valor para a sociedade não é devidamente reconhecido, e que nossa profissão está sendo a cada dia precarizada, quando deveria ser o contrário. Por isto estamos na rua para dizer do nosso valor e mudar esta história.
Manifestação de apoio à greve reuniu professores, funcionários e estudantes, em João Pessoa, durante o 33º ENED.
Ângela continuou seu relato contando que quando foi fotografada na formatura da filha sentiu-se envergonhada, porque não seria bonita, nem fotogênica. Uma das feministas presentes disse em seguida: "você é linda, porque bonitas são as mulheres que lutam!". Ela ressaltou que estava diante de uma mulher que não mediu esforços para lutar contra o Estado e responsabilizar os autores da chacina.

Por fim, Ângela, que sabe que em seu país professores não têm o devido valor, e que o Estado não se compromete seriamente pela educação e pela justiça, arrematou: "Quando me disseram que eu poderia recorrer da última decisão do juíz que deixou impunes os autores da chacina, eu disse não".

Depois de anos de brigas judiciais, Ângela disse não.

Mas a reunião não terminou assim, uma das moradoras relatou que estava aposentada e que passava os seus dias na associação, o que despertava o ciúmes de seu marido. Disse que ele muitas vezes queria impedi-la de sair de casa. Mas com a sabedoria das mulheres que lutam, disse: "Hoje ele diz que eu não posso sair e eu me faço de surda. Coitado, ele ainda não percebeu que não manda mais em mim". Pra completar, falou sobre a política da associação: "Aqui pode entrar qualquer um, ninguém vai perguntar se é homem, se é mulher, a preferência sexual, não tem isso não. Prefiro estar aqui, pois sozinha em casa eu fico pensando bobagem".

Naquela tarde aprendi mais sobre o Direito e o Estado do que em muitos anos de faculdade. 

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

O movimento docente das universidades federais: indignação na UFT

Duas perguntas. Apenas duas perguntas são o suficiente para demonstrar como os professores estão se sentindo neste agosto, mês da votação da Lei do Orçamento (vale lembrar que em muitos lugares do país os servidores técnico-administrativos foram os pioneiros na greve e que muitos estudantes também estão mobilizados neste movimento geral). Por um lado, os problemas locais das universidades federais – e da educação pública em geral – se avolumam; de outro, as dificuldades no plano nacional, oriundos de questões estruturais inerentes a nosso sociedade e à forma de gerir nossa política. A pequena entrevista é com a assessora jurídica popular e professora da Universidade Federal do Tocantins – a primeira universidade federal a viver uma greve docente este ano – Shirley Andrade.


Entrevista com Shirley Andrade (professora da UFT)

AJP - Como você está avaliando a mobilização docente durante a greve na UFT?

SA - Percebemos que na UFT a mobilização é forte. Mais de 60% dos professores não terminou o primeiro período deste semestre. Houve manifestos dos professores em frente do portão. Mas isto não surgiu agora, desde o ano passado que a greve vem sendo construída. É uma universidade muito nova e que tem sentido na pele e no ensino universitário sem estrutura. Todos os 07 campi da UFT estão em greve, fomos a primeira universidade no Brasil a ficar em greve. Mas percebemos que há uma diferença em relação a universidades mais tradicionais porque aqui a grande maioria é dedicação exclusiva e não temos grandes projetos. Nossa universidade vive praticamente do salário desvalorizado. Sentimos na pele a marginalização dos investimentos federais, dos projetos. Portanto, há várias condições para que a mobilização venha sendo construída já há algum tempo.

AJP - Quais as perspectivas de ganhos nesta greve, para vocês?

SAOlha, conforme as negociações estão seguindo pelo governo federal teremos praticamente ganho nenhum. Como somos uma universidade nova, a incorporação da Gemas muda muito pouco nossa vida. A proposta de 4% chega a desrespeitar a nossa dignidade. Tanto os juízes como os militares vão ter aumentos reais. a greve para nós é um instrumento fundamental de luta, pois há uma postura de desrespeito do ministério de planejamento. Desde março, o ANDES apresentou a proposta e até agora não se consegue chegar a uma proposta digna. e o secretario chega a dizer em reuniões recentes que não sabe o impacto das propostas, estou me sentindo extremamente desrespeitada enquanto categoria, por isso acredito que a greve é o instrumento de nos sentirmos respeitados. Não temos condições de trabalho, nossa carga horária de aula é muito alta, em nossa instituição damos 12h por semana, e somos impelidos a publicar, pesquisar. Há uma cobrança da função social da universidade, mas não se tem um aparato para que isto aconteça. Principalmente nas universidades do norte. Neste momento emergencial somente estamos discutindo a questão salarial e ainda assim há todo este desrespeito. O que sentimos é um desânimo da categoria em continuar a ser professores. As pessoas estão pensando em ser qualquer funcionário publico federal que recebe mais do que um professor. Por isso, a greve é um instrumento fundamental para que haja uma valorização.

domingo, 5 de junho de 2011

Os direitos humanos e sua incompreensão

Por Luiz Otávio Ribas

Algumas pessoas tem dificuldade para compreender as idéias de direitos humanos e Estado de Direito. Partem de pressupostos indefinidos por qualquer teoria, doutrina ou ideologia política. Estes abandonaram a reflexão e seguem acreditando que seus devaneios continuam legitimados por um argumento de autoridade ou outro subterfúgio de uma sociedade desigual e desconhecida.
Desigual porque estamos divididos entre os muitos que lutam para comer e os pouquíssimos que atuam para continuarem onde estão. Desconhecida porque estas relações antes referidas estão todas encobertas, principalmente pela morte de teorias antigas que foram “assassinadas” em um epistemicídio de nota de rodapé. Muitos não perdem tempo explicando o porquê do abandono da análise concreta da realidade. Pouquíssimos o fazem e seguem sendo desrespeitados, como antigamente. E a sociedade do conhecimento também segue desigual e desconhecida.
O conhecimento popular é desrespeitado em jornais, revistas, canais de televisão, de rádio, por muitos dos entendidos intérpretes da opinião pública e analistas sociais. Os intelectuais brasileiros precisam buscar espaço na mídia aprendendo a língua do povo, o português falado, aquele mesmo que sofre preconceito lingüístico. Enquanto não o fizermos, Alborghetti, entre outros, continuarão sendo referências mortas na discussão dos direitos humanos, e o “Capitão Nascimento” da vida real analista da segurança pública. Vamos falar a língua da academia, do jornal e do povo, nenhuma lembra a outra.
O preconceito com a linguagem popular e a falta de referências políticas definidas trazem argumentações que beiram a mágica do absurdo. Escutei que defesa do Estado de Direito é a manutenção da ordem, mesmo que contra a Constituição. Escutei que os direitos humanos são fracos porque aqueles que os defendem estão preocupados apenas com os bandidos. Qual a ideologia política de alguém que acredita que a Constituição precisa ser desrespeitada em situações de extrema urgência e necessidade? E aquele que acredita que os direitos humanos não servem porque existem pessoas que o defendem, de uma maneira errada, sob um determinado ponto de vista? Só consigo chegar a mesma conclusão, a cada debate, a cada comentário: são todos seguidores de Carl Schmitt e do Estado de Exceção. Ninguém está disposto a aceitar verdadeiramente o pressuposto de universalidade dos direitos humanos.
 Enquanto abdicarmos da reflexão crítica e em situarmos no debate nossas posições políticas continuaremos perpetuando a lógica do absurdo. Assim, me posiciono. Defendo, estrategicamente, o Estado de Direito e os direitos humanos, numa perspectiva social e democrática (e não social-democrata), apenas para dialogar com a direita brasileira. Se conseguirmos convencer a direita a assumir-se ideologicamente durante este debate poderemos evitar muita dor de cabeça, e aprender a ignorar quem não é nem mesmo de direita.

O Brasil vai parar
Um exemplo simples. Servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada querem reivindicar seus direitos por meio de uma greve. A greve voltou a ser um direito constitucional, desde 1988. O governo utiliza sua polícia e seus aparelhos midiáticos para criminalizar a greve dos servidores públicos. Suspende-se o direito constitucional para estes, legitima-se pela lógica do absurdo: greve é baderna, eles exageraram, ou outros argumentos sem linha política definida. Quem perde com isto é a opinião pública, que precisa refletir e construir sua visão com base nisso – o argumento da autoridade da exceção. Trabalhadores da iniciativa privada fazem uma das maiores greves da história. Motivos para comemorar? Os intérpretes de plantão dirão: veja quanto prejuízo econômico, veja que irresponsabilidade.
Num Estado de Direito precisamos de greve e de direitos humanos, é difícil entender por quê? Por fim, tuito: O dia que os dogmáticos defenderem o direito de greve a história acabou, como queria Fukuyama.

domingo, 20 de junho de 2010

O que é a greve?

O que é a greve?
A greve é o exercício da autodefesa dos trabalhadores frente a arbitrariedade do Estado, que admite a sua superexploração.
O Estado brasileiro exerce seu poder de dominação por meio do direito do trabalho. O direito de greve regulamentado pelo Estado é uma autorização para intervenção direta de aniquilação da manifestação política autêntica e espontânea dos trabalhadores. Sem a pressão exercida pelo Estado para controlar as greves de trabalhadores o regime capitalista não teria se sustentado historicamente. O triunfo do direito do trabalho estatal foi possível por sua contradição dialética: ao tempo que é controle e dominação, é também garantia de emprego assalariado.

Agora, como o capitalismo traz em si os elementos para sua própria destruição, os subempregos, o desemprego, a precarização das condições de trabalho, colocam o trabalhador novamente fora da proteção estatal. Neste contexto abre-se novamente a oportunidade para a expressão política espontânea e autêntica do trabalhador, que é revoltar-se e insurgir-se contra tudo aquilo que o oprime - sua libertação.
O direito do trabalho estatal não alcança mais a maioria dos trabalhadores brasileiros. Hoje, o direito que regula as relações de trabalho é composto por regras criadas pelos detentores dos meios de produção, algumas negociadas com os trabalhadores.
O Estado nem autoriza, nem desautoriza, a regulamentação dos relações de trabalho por regras autônomas impostas pela burguesia e as negociadas com os trabalhadores. Simplesmente o Estado não existe, confunde-se com a própria classe que o criou. A superação do Estado implica na sua própria criação. A divisão Estado e sociedade civil nunca existiu de fato.

Luiz Otávio Ribas - professor de filosofia do direito e assessor jurídico popular